segunda-feira, 13 de abril de 2009

apontamentos de direito das sucessões - O FENOMEMO JURIDICO SUCESSÓRIO

O Fenómeno Jurídico-sucessório

24. A abertura da sucessão: a morte como pressuposto da sucessão

A abertura da sucessão corresponde, em termos técnico-jurídicos, a uma situação de ruptura, de cisão, de perda relativa, que a morte de alguém vai necessariamente gerar quanto às situações jurídico-patrimoniais de que esse alguém era titular.

É evidente que a morte é pressuposto, é causa da sucessão (art. 2024º CC).

O direito das sucessões está confinado ao estudo das consequências jurídicas provocadas pela morte física. Excluem-se, assim, do âmbito do fenómeno sucessório as consequências da extinção de uma pessoa colectiva, aspecto regido, nomeadamente, pelo art. 166º CC.

A afirmação regra de que o direito das sucessões tem a ver, fundamentalmente, com a morte em sentido físico, há, porém, uma situação que a lei faz aproximar, na sua configuração jurídica, da morte física. Reporta-se à morte presumida, adentro do instituto da ausência (arts. 114º e 115º[20] CC).

25. O momento da abertura da sucessão (art. 2031º CC)

O art. 2031º CC[21], diz que a sucessão se abre no momento da morte do seu autor, ou seja, no primeiro momento de ausência de vida.

É no momento da abertura da sucessão que a designação sucessória se fixa na vocação: o chamado a suceder é o titular da designação sucessória prevalecente, no momento da abertura da sucessão.

O conceito de vocação não é, um conceito unívoco, ele implica, por força conjugada da actuação de um facto designativo e da morte, a atribuição ao sucessível ou sucessíveis chamados, portanto aos sucessores virtuais, do direito de suceder, o chamado ius delationis, ou seja, um direito potestativo, originário e instrumental de aceitar ou repudiar a herança ou o legado que lhes compete.

O exercício do direito de suceder, o direito potestativo de aceitar ou repudiar, esse exercício retroagirá na sua eficácia jurídica, à data da abertura da sucessão.

26. O lugar da abertura da sucessão

Estatui, também o art. 2031º CC, que o lugar da abertura da sucessão é o último domicílio do autor da sucessão. O sistema de situar espacialmente a abertura da sucessão no último domicílio do de cuius tem não só a vantagem de juridicamente, para efeitos vários, unificar o fenómeno sucessório, como também de o reportar a um local normalmente mais conhecido por todos aqueles que têm interesses ligados à herança (credores, fisco) do que, por exemplo, o domicílio dos herdeiros ou o lugar da situação dos bens.

27. A vocação sucessória: conceito de vocação

Aberta a sucessão de alguém, pela eficácia conjugada dos factos designativos prevalecentes e da morte concretiza-se a vocação dos sucessíveis prioritários.

Embora a sucessão seja normalmente uma transmissão, o conteúdo jurídico da vocação é um poder originário, através de cujo exercício se concretiza, ou não (pelo repúdio), a aquisição sucessória. É um poder instrumental que se extingue automaticamente pelo seu exercício.

A vocação, pode ser olhada pelo prisma não dos sucessíveis chamados, mas dos bens ou parte da herança a que os mesmos são chamados.

A vocação sucessória é o chamamento à sucessão, no momento da morte do de cuius, feita pela lei ou por força do negócio jurídico, do(s) titular(es) da designação sucessória prevalecente. No caso de vocação de herdeiro, este é chamado a suceder na totalidade das relações de herdeiro do de cuius, ou numa quota alíquota destas; o legatário é chamado a suceder em relações jurídicas certas e determinadas.

28. Os pressupostos da vocação sucessória

A concretização da vocação pressupõe a observância de requisitos. São pois, esses requisitos os pressupostos da vocação sucessória, que o art. 2032º/1 CC, genericamente enuncia quando estatui que: “aberta a sucessão, serão chamados à titularidade das relações jurídicas do falecido aqueles que gozam de prioridade na hierarquia dos sucessíveis, desde que tenham a necessária capacidade”. Deste preceito pode inferir-se que são pressupostos do chamamento ou vocação sucessória são a prioridade na hierarquia dos sucessíveis, a necessária capacidade, e, a existência do chamado.

29. A existência do chamado

A existência do chamado como pressuposto da vocação sucessória pode distinguir-se dois aspectos: o regime da herança deixada a um ausente, a sobrevivência do chamado ao de cuius, que tem de ocorrer, nem que seja por um instante temporal.

A propósito da sobrevivência como pressuposto da vocação sucessória. A presunção de comoriência (art. 68º/2[22] CC). Presume a lei que, havendo dúvidas quanto ao momento do falecimento de duas ou mais pessoas, a respectiva morte ocorre simultaneamente, concomitantemente, daí decorrendo, desse modo para a comoriência, o campo sucessório, o mesmo regime da pré-morte, uma vez que não existirá sobrevivência do chamado.

A figura da transmissão do direito de suceder (ius delationis), a que se reporta o art. 2058º CC[23], e que é ainda reafirmação do pressuposto da vocação sucessória da existência de chamado, mostra bem a relevância jurídica do art. 68º/2 CC, uma vez que a presunção de comoriência vai gerar, por si, o chamamento a dada sucessão do sucessível subsequente do comoriente, e não dos respectivos herdeiros, porque não se concretizou qualquer vocação.

Outro ponto de referência, a propósito da existência do chamado como pressuposto da vocação sucessória, é o regime da herança (ou legado) deixada a um ausente, tomando-se aqui a ausência em sentido técnico-jurídico.

Serão chamados os sucessíveis subsequentes, encontrados de acordo com os mecanismos sucessórios do ausente, que naturalmente não foi chamado (art. 120º CC).

A existência do chamado pressupõe inerentemente a respectiva personalidade jurídica. Mas aqui não pode deixar de colocar-se, desde logo um problema, já que a lei reconhece capacidade sucessória aos nascituros concebidos (art. 2033º/1 CC) e também aos nascituros não concebidos ou concepturos (art. 2033º/2-a CC).

30. A titularidade da designação prevalecente

Decorre do art. 2032º/1[24] CC, que é pressuposto da vocação sucessória a titularidade da designação prevalecente, quer dizer,. A titularidade do facto designativo prevalecente adentro da hierarquia dos factos designativos.

E é-o relativamente à parte (ou inclusive, à totalidade) de herança ou do património do de cuius face à qual opera essa prevalência.

Quer isto dizer que relativamente às mesmas situações jurídico-patrimoniais da herança do autor da sucessão não pode concretizar-se mais do que uma vocação.

31. A capacidade sucessória: indignidade e deserdação

Para ser chamado à sucessão, o titular da designação sucessória prevalecente tem de ser capaz perante o de cuius.

Capacidade sucessória, é a aptidão para ser chamado a suceder em relação a uma certa pessoa, como herdeiro ou legatário (art. 2033º CC).

A capacidade sucessória é no fundo, a personalidade jurídica ou a capacidade de gozo (activa) de adquirir o direito de suceder mortis causa a outrem. Uma coisa é capacidade sucessória, e outra, a capacidade de testar ou para fazer testamento (arts. 2188º segs. CC); para intervir na partilha, etc.

O momento da apreciação da capacidade sucessória é o da abertura da sucessão (arts. 2033º/1 – 2035º CC).

Do outro lado tem-se a incapacidade, nomeadamente a chamada incapacidade sucessória por indignidade.

As incapacidades sucessórias estão reguladas pelo art. 2034º CC[25]. Tratam-se de incapacidade relativas, que funcionam só em relação ao autor da sucessão, e que se fundam, numa ideia de indignidade do sucessível, em virtude da prática de actos deste, directa ou indirectamente, contra o autor da sucessão.

O carácter relativo da indignidade é só por si inconciliável com uma verdadeira incapacidade. O indigno não é um incapaz de suceder, porque pode adquirir verdadeiramente por sucessão e assim concorrer à sucessão de outras pessoas. Substancialmente a indignidade é uma ilegitimidade, o que é apontado pelo seu carácter de relação.

O art. 2034º CC, indica pois, as causas de incapacidade sucessória, por motivo de indignidade, que podem reconduzir-se, de um ponto de vista sistemático, a quatro tipos distintos: decorrentes do atentado contra a vida do testador (arts. 2034º-a CC); contra a honra do testador (art. 2034º-b CC); contra a liberdade de testar (art. 2034º-c CC); e contra o próprio testamento (art. 2034º-d CC).

O herdeiro e o legatário indignos, podem readquirir a capacidade sucessória. O instituto da reabilitação pode revestir duas modalidades: a reabilitação expressa (art. 2038º/1 CC), feita pelo autor da sucessão, em testamento ou escritura pública, relativamente ao que tiver incorrido em indignidade, mesmo que esta já tenha sido judicialmente declarada; e a reabilitação tácita (art. 2038º/2 CC), que decorre do facto de o indigno ser contemplado em testamento quando o testador já conhecia a causa da indignidade.

A deserdação é um instituto específico da sucessão legitimária, regulado nos arts. 2166º e 2167º[26] CC, cujas causas não são coincidentes com as da indignidade.

O art. 2166º[27] CC, admite a privação do direito à legítima por determinação da vontade do autor da herança (a chamada deserdação), fixa o seus respectivos pressupostos e traça o seu regime jurídico.

A legítima, que é um direito sucessório atribuído por lei a determinadas pessoas, independentemente da vontade do autor da herança, em atenção ao vínculo familiar que as une a o falecido, pode afinal ser afastada, por declaração expressa da vontade do finado, quando actos excepcionalmente graves do sucessível o justifiquem.

É precisamente ao acto de privação da legítima, determinado pelo testador em alguma das circunstâncias excepcionais taxativamente descritas na lei, que esta dá o nome de deserdação.

A deserdação não priva apenas o sucessível legitimário da respectiva legítima (subjectiva). Com efeito, sendo a legítima subjectiva parte da quota indisponível, aquela que o autor da sucessão não pode tanger.

A deserdação é, um acto jurídico impugnável, por via de uma acção judicial, que caduca no prazo de dois anos a contar do testamento.

32. Modalidades de vocação

A vocação originária, é a que se verifica no momento da abertura da sucessão (art. 2032º/1, no princípio CC), por força conjugada da actuação de um facto designativo e da morte como facto causal principal, já que a aceitação se limita a concretizar a transmissão que a vocação como que põe à disposição”, desde logo, do sucessível chamado (art. 2050º CC).

A vocação subsequente, só se concretiza em momento posterior ao da abertura da sucessão (ex. arts. 2229º, 2237º, 2239º CC).

Também se pode falar na vocação subsequente dos nascituros concebido ou não concebido, em que o nascimento, e apenas ele, concretiza a vocação (art. 66º/2 CC).

Refira-se ainda a situação do fideicomisso (arts. 22876º segs. CC), em que alguém é instituído, mas com obrigação de conservar os bens e os fazer reverter por sua morte para outrem.

A existência possível de uma vocação subsequente importa, via de regra, da parte do legislador a adopção de medidas de protecção ou tutela da mesma, podendo normalmente configurar verdadeiras situações de expectativa jurídica.

Tal como o negócio jurídico, designadamente os negócios unilaterais entre vivos e os contratos, também as disposições testamentárias, quer consistam na instituição como herdeiro, quer na nomeação de legatários, podem ser sujeitas a cláusulas, limitativas da sua validade ou da sua eficácia (arts. 2229º a 2248º - arts. 270º segs. CC).

33. Vocação una e múltipla

A distinção entre estas modalidades de vocação assenta na circunstância de um sucessível ser chamado a suceder com base num único título de vocação ou em mais, ou com base numa única qualidade – herdeiro ou legatário – ou em ambas.

Excepções à regra da indivisibilidade

· Se alguém é chamado à herança simultânea ou sucessivamente por testamento desconhecia a existência do testamento (art. 2055º/1 CC[28]);

· O sucessível legitimário, que também é chamado há herança testamentariamente, pode repudiá-la quanto à quota disponível e aceitá-la quanto à legítima (art. 2027º CC[29]);

· O legatário pode aceitar um legado e repudiar outro, contanto que este último não esteja onerado por encargos impostos pelo testador (art. 2250º/1 CC[30]);

· O herdeiro que seja ao mesmo tempo legatário tem a faculdade de aceitar a herança e repudiar o legado, ou vice-versa, se a deixas repudiada não estiver sujeita a encargos (art. 2250º/2 CC).

34. Vocação directa e indirecta

Se a vocação directa é a regra, a indirecta dá-se quando alguém é chamado à sucessão “não apenas em atenção à relação existente entre o sucessível e o de cuius, mas também em função da sua posição perante um terceiro, que não entra na sucessão mas serve de ponto de referência para a devolução”.

Na vocação indirecta não há nenhum fenómeno de dupla vocação, mas que o que se passa é, tão-só, que a vocação do sucessível prioritário, que não pode ou não quer aceitar, vai moldar, a vocação de outrem que, como que vai ocupar a sua posição sucessória.

Quer dizer, a vocação indirecta chama naturalmente, também, um sucessível subsequente. Só que a vocação deste não é autónoma, pois se justapõe à do sucessível, que não pôde, ou não quis aceitar, o qual lhe serve de ponto de referência.

São tradicionalmente apontadas como modalidades de vocação indirecta, a substituição vulgar ou directa (art. 2281º segs. CC); o direito de representação (arts. 2039º segs. CC) e o direito de acrescer (arts. 2301º segs. CC).

O ius delationis, é um direito instrumental potestativo, naturalmente susceptível de avaliação pecuniária, integrante do património do transmitente, ainda que reportado à herança de um outro de cuius.

Os herdeiros do transmitente detêm, uma vocação directa face ao transmitente, mas indirecta relativamente à sucessão a que este chegou a ser chamado.

35. Vocações anómalas: a substituição directa ou vulgar

Vem regulada nos arts. 2281º[31] segs. CC, e consiste na designação pelo testador de alguém que, se substitua ao sucessível prioritário instituído, para o caso de este não poder ou não querer aceitar a herança ou o legado (arts. 2285º/2 – 2302º CC).

O substituto acaba por ser um sucessível instituído sob condição suspensiva, pois a sua vocação dependerá sempre da resolução ou da não concretização da vocação do substituído, à qual terá que sobreviver. O substituto é, assim, um sucessível subsequente, pois o seu chamamento só se concretiza num momento ulterior à data da abertura da sucessão, embora retroagindo a esse momento.

Pode ser: singular, plural (art. 2282º CC), recíproca (art. 2283º/2 e 3 CC) e de um ou mais graus.

No caso do substituto não poder ou não querer aceitar, e se tiver descendentes, parece ser de aplicar analogicamente o art. 2317º-b CC, que impedirá o funcionamento do direito de representação se a vocação do substituto não tiver chegado a existir.

A substituição directa em princípio, não parece dever operar, se a vocação do substituído tiver chegado a concretizar-se, dando azo à transmissão do direito de suceder; salvo talvez, se puder interpretativamente (art. 2187º CC) vislumbrar-se na cláusula testamentária uma intenção institutiva de uma substituição fideicomissária, pois de outro modo não se vê que possa o testador “predeterminar” uma sucessão já alheia.

36. O direito de representação

Dá-se quando a lei chama os descendentes de um herdeiro ou legatário a ocupar a posição daqueles que não pôde ou não quis aceitar o legado (art. 2039º CC).

O art. 2040º CC, define o âmbito do direito de representação, que considera aplicável tanto à sucessão legítima e legitimária, como à sucessão testamentária.

O direito de representação constitui uma excepção à regra da sucessão legítima de que o parente mais próximo exclui o parente mais afastado de cada classe (art. 2135º CC). No direito de representação, o parente mais afastado substitui o parente mais próximo que não quis ou não pôde suceder, sucedendo em vez dele.

Pressupostos do direito de representação:

a) Sucessão legal, depende de dois pressupostos (art. 2042º CC[32]): o primeiro é a falta de um parente na primeira ou na quarta classe de sucessíveis do art. 2133º CC (descendentes do de cuius ou irmãos e descendentes). A noção de falta de um parente, compreende as hipóteses de pré-morte, incapacidade por indignidade, deserdação, ausência e repúdio. O segundo pressuposto, é a existência de descendentes do parente excluído da sucessão.

b) Sucessão testamentária, segundo o disposto no art. 2041º CC, a representação dá-se na sucessão testamentária, no caso de pré-morte, de repúdio e de ausência (art. 120º CC), mas já não no caso de incapacidade. A representação não admite na sucessão testamentária em qualquer das circunstâncias previstas no art. 2041º/2 CC:

· O testador designou um substituto para o herdeiro e legatário (art. 2041º/2-a CC);

· Se o fideicomissário não puder ou não quiser aceitar a herança, fica sem efeito a substituição, e a titularidade dos bens hereditários considera-se adquirida definitivamente pelo fiduciário desde a morte do testador (art. 2041º/2-b CC);

· A representação não se verifica no legado de usufruto ou de outro direito pessoal (art. 2041º/2-c CC).

Não haverá lugar ao direito de representação “se tiver sido designado substituto ao herdeiro ou legatário” (art. 2041º/2-a CC), sendo que parece admissível, que a substituição possa relevar no âmbito da sucessão legítima, onde afastaria igualmente o direito de representação.

Não haverá também lugar ao, direito de representação (art. 2041º/2-b CC) “em relação ao fideicomissário, nos termos do art. 2293º/2 CC”. O fideicomissário, herdeiro ou legatário testamentariamente instituído para quem reverter os bens do fiduciário por morte deste, tem, para concretizar a sua vocação sucessória, que lhe sobrevier, facto futuro e incerto, que desse modo, acondiciona (arts. 2293º/1 e 2294º CC).

Quanto ao fiduciário que não possa ou não queira aceitar e que eventualmente tenha descendentes. Ainda aqui não funciona o direito de representação, por força do conversão do fideicomisso em substituição directa ditada pelo art. 2293º/3 CC.

Não se verifica também o direito de representação relativamente ao legado de usufruto ou de outro direito pessoal, o que se entende facilmente, porque a natureza vitalícia ou pessoal desse tipo de situações jurídicas, ainda que de cunho patrimonial, não se harmonizará evidentemente, com o efeito jurídico da ocupação pelo representante da posição sucessória detida pelo representado.

A sucessão testamentária também não revelará o direito de representação na hipótese de instituição de herdeiro ou legatário sob condição suspensiva (arts. 2229º segs. CC).

O direito de representação origina três tipos fundamentais de efeitos:

1) Chama à sucessão quem, de outro modo, não sucederia, por não ser um sucessível prioritário, nem testamentário, nem legal (arts. 2135º e 2138º CC);

2) Opera por estripes (linha recta descendente – art. 1580º CC – do sucessível prioritário que não pôde ou não quis aceitar) ou por subestripes (art. 2044º/1 e 2 CC);

3) Confinadamente à sucessão legal, dispõe o art. 2045º CC, a referência ao parentesco, facto designativo legal é, realmente, explícita da especialidade desse efeito, pelo que, a circunstância de o direito de representação operar no caso de estripe única só releva em sede de sucessão legal, nomeadamente legitimária.

37. Direito de acrescer[33]

Este instituto visa regulamentar a hipótese de dois ou mais herdeiros terem sido instituídos na totalidade ou numa quota de bens, fosse ou não conjunta a instituição, e algum deles não poder ou não querer aceitar a herança.

O direito de acrescer, com o preenchimento da quota vaga que o caracteriza, importa, realmente, numa verdadeira substituição do herdeiro instituído ou do legatário nomeado pelo sucessor titular daquele direito e, por conseguinte, na transmissão de uma posição jurídica.

O acrescer opera dentro de cada título de vocação sucessória. Tal decorre do art. 2301º CC, que se reporta ao acrescer “aos outros sucessíveis da mesma classe sem prejuízo do disposto no art. 2143º CC”.

38. A substituição fideicomissária

Como decorre do art. 2286º CC, a substituição fideicomissária ou fideicomisso gera duas vocações distintas: a do fiduciário e a do fideicomissário, realmente ambas anómalas.

O fideicomisso é, “ a disposição pela qual o testador impõe ao herdeiro instituído o encargo de conservar a herança, para que ela reverta, por sua morte, a favor de outrem”; o herdeiro gravado com o encargo chama-se fiduciário, e fideicomissário o beneficiário da substituição.

É um facto que, sendo o fiduciário um proprietário (art. 2293º/2 CC), ainda que fortemente restringido nos poderes de disposição e oneração dos bens objecto do fideicomisso (art. 2291º CC), juridicamente e por sua morte, o fideicomissário suceder-lhe-ia.

39. A herança jacente

Diz-se jacente a herança aberta, mas ainda não aceite nem declarada vaga para o Estado (art. 2046º CC).

Com a abertura da sucessão concretiza-se, a vocação ou chamamento dos sucessíveis (art. 2032º CC) e a inerente atribuição aos mesmos de um direito originário, potestativo de natureza instrumental, de aceitar ou repudiar a herança ou o legado, em que por lei ou testamento foram designados.

Enquanto esse direito não for exercido dir-se-á que a herança está jacente. Três elementos em torno dos quais a lei fixa os limites da jacência da herança.

Por um lado, é necessário que tenha havido abertura da sucessão.

Em segundo lugar, exige-se que não tenha havido ainda aceitação da herança, mesmo que o herdeiro (chamado) seja conhecido e os bens hereditários se encontrem detidos por ele.

Por último, é essencial que a herança ainda não tenha sido declarada vaga.

40. Aceitação e repúdio

A aquisição dos bens postos à disposição do chamado opera-se mediante a aceitação deste.

A aceitação (art. 2050º CC[34]) é um direito potestativo, podendo o chamado exercê-lo ou não livremente. Acto jurídico unilateral e não receptício. São-lhe aplicáveis, com algumas modificações, os princípios gerais dos negócios jurídicos quanto à capacidade, vícios da vontade etc.

A aceitação pode ser expressa ou tácita, pura e simples, ou a benefício de inventário.

A aceitação é expressa quando, em documento escrito, o chamado declara aceitar a herança, ou assuma o título de herdeiro com a intenção de adquirir (art. 2056º/2 CC); é tácita, quando resultar de factos concludentes (art. 217º/1 CC).

A aceitação pura e simples (art. 2052º/1 CC) porque nenhuma reserva acrescenta à declaração de adesão ao chamamento da lei ou do autor da sucessão.

A aceitação a benefício de inventário (art. 2052º/1 CC), o proveito que pode retirar do instrumento jurídico (inventário) que identifica com precisão os bens – e também as dívidas – do de cuius.

O repúdio da herança, é o acto pelo qual o chamado responde negativamente ao chamamento, declarando que rejeita os bens colocados à sua disposição (art. 2062º CC[35]).

O repúdio é um direito potestativo, com eficácia retroactiva em relação ao momento da abertura da sucessão. Isto permite que o chamado subsequente, que aceite, seja considerado herdeiro desde o momento da abertura da sucessão, data em relação à qual se reportam os efeitos da aceitação.

41. Administração, liquidação e partilha da herança

Ela compete ao cabeça-de-casal até à liquidação e partilha da herança.

A administração pelo cabeça-de-casal abrange a totalidade do património hereditário (art. 2087º/2[36] CC), podendo o cabeça-de-casal “pedir aos herdeiros ou a terceiros a entrega dos bens que deva administrar e que estes tenham em seu poder, e usar contra eles acções possessórias a fim de ser mantido na posse das coisas sujeitas a sua gestão ou a ela restituído” (art. 2088º/1[37] CC).

O herdeiro, diversamente do cabeça-de-casal, é fundamentalmente um liquidatário da herança, sendo os seus poderes de gestão do património hereditário muito diferentes dos de mera administração do cabeça-de-casal, contudo a lei confere-lhes ainda a possibilidade de, conforme o disposto nos arts. 2047º e 2048º CC, praticarem, em certas circunstancias, actos ou, inclusive, de pedirem a nomeação de um curador à herança jacente.

[20] A declaração de morte presumida produz os mesmos efeitos que a morte mas não dissolve o casamento, sem prejuízo no disposto no artigo seguinte.

[21] A sucessão abre-se no momento da morte do seu autor e no lugar do último domicílio dele.

[22] Quando certo efeito jurídico depender da sobrevivência de uma a outra pessoa, presume-se, em caso de dúvida, que uma e outra faleceram ao mesmo tempo.

[23] 1. Se o sucessível chamado à herança falecer sem a haver aceitado ou repudiado, transmite-se aos seus herdeiros o direito de a aceitar ou repudiar.

2. A transmissão só se verifica se os herdeiros aceitarem a herança do falecido, o que os não impede de repudiar, querendo, a herança a que este fora chamado.

[24] Aberta a sucessão, serão chamados à titularidade das relações jurídicas do falecido aqueles que gozam de prioridade na hierarquia dos sucessíveis, desde que tenham a necessária capacidade.

[25] Carecem de capacidade sucessória, por motivo de indignidade:

a) O condenado como autor ou cúmplice de homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o autor da sucessão ou contra o seu cônjuge, descendente, ascendente, adoptante ou adoptado;

b) O condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas, relativamente a crime a que corresponda pena de prisão superior a dois anos, qualquer que seja a sua natureza;

c) O que por meio de dolo ou coacção induziu o autor da sucessão a fazer, revogar ou modificar o testamento, ou disso o impediu;

d) O que dolosamente subtraiu, ocultou, inutilizou, falsificou ou suprimiu o testamento, antes ou depois da morte do autor da sucessão, ou se aproveitou de algum desses factos.

[26] A acção de impugnação da deserdação, com fundamento na inexistência da causa invocada, caduca ao fim de dois anos a contar da abertura do testamento.

[27] 1. O autor da sucessão pode em testamento, com expressa declaração da causa, deserdar o herdeiro legitimário, privando-o da legítima, quando se verifique alguma das seguintes ocorrências:

a) Ter sido o sucessível condenado por algum crime doloso cometido contra a pessoa, bens ou honra do autor da sucessão, ou do seu cônjuge, ou algum descendente, ascendente, adoptante ou adoptado, desde que ao crime corresponda pena superior a seis meses de prisão;

b) Ter sido o sucessível condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas;

c) Ter o sucessível, sem justa causa, recusado ao autor da sucessão ou ao seu cônjuge os devidos alimentos.

2. O deserdado é equiparado ao indigno para todos os efeitos legais.

[28] Se alguém é chamado à herança, simultânea ou sucessivamente, por testamento e por lei, e a aceita ou repudia por um dos títulos, entende-se que a aceita ou repudia igualmente pelo outro; mas pode aceitá-la ou repudiá-la pelo primeiro, não obstante a ter repudiado ou aceitado pelo segundo, se ao tempo ignorava a existência do testamento.

[29] A sucessão legal é legítima ou legitimária, conforme possa ou não ser afastada pela vontade do seu autor.

[30] 1. O legatário não pode aceitar um legado em parte e repudiá-lo noutra parte; mas pode aceitar um legado e repudiar outro, contanto que este último não seja onerado por encargos impostos pelo testador.

2. O herdeiro que seja ao mesmo tempo legatário tem a faculdade de aceitar a herança e repudiar o legado ou de aceitar o legado e repudiar a herança, mas também só no caso de a deixa repudiada não estar sujeita a encargos.

[31] 1. O testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro instituído para o caso de este não poder ou não querer aceitar a herança: é o que se chama substituição directa.

[32] Na sucessão legal, a representação tem sempre lugar, na linha recta, em benefício dos descendentes de filho do autor da sucessão e, na linha colateral, em benefício dos descendentes de irmão do falecido, qualquer que seja, num caso ou noutro, o grau de parentesco.

[33] Vide n.º 22

[34] 1. O domínio e posse dos bens da herança adquirem-se pela aceitação, independentemente da sua apreensão material.

2. Os efeitos da aceitação retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão.

[35] Os efeitos do repúdio da herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerando-se como não chamado o sucessível que a repudia, salvo para efeitos de representação.

[36] 2. Os bens doados em vida pelo autor da sucessão não se consideram hereditários e continuam a ser administrados pelo donatário.

[37] 1. O cabeça-de-casal pode pedir aos herdeiros ou a terceiro a entrega dos bens que deva administrar e que estes tenham em seu poder, e usar contra eles de acções possessórias a fim de ser mantido na posse das coisas sujeitas à sua gestão ou a ela restituído.

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