segunda-feira, 20 de abril de 2009

casos praticos dir. sucessões

Sucessões – Hipóteses resolvidas nas aulas práticas

[4º Ano]

Carlos Fernandes – 2007/2008

I – Sucessões------------------------------------------------------------------------------- 2

1.º Caso (Nº 53) ---------------------------------------------------------------- --------------- 2

2.º Caso (Nº 54) ---------------------------------------------------------------- --------------- 2

3.º Caso (Nº 50) ---------------------------------------------------------------- --------------- 4

4.º Caso (Nº 52) ---------------------------------------------------------------- --------------- 6

5.º Caso (Nº 55) ---------------------------------------------------------------- --------------- 8

6.º Caso (Nº 56) ---------------------------------------------------------------- ------------- 10

7.º Caso ditado (1)-------------------------------- ------------------------------------------ 14

8.º Caso (Nº 58) ---------------------------------------------------------------- ------------- 15

9.º Caso ditado (2)-------------------------------- ------------------------------------------ 21

10.º Caso (Nº 64)-------------------------------- -------------------------------------------- 22

11.º Caso (Nº 60)-------------------------------- -------------------------------------------- 26

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 53)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

2

I – Sucessões

1.º Caso (Nº 53)

António e Berta casaram em 1993 e tiveram quatro filhas: Catarina, Dalila, Ester e Filipa.

António falece em Janeiro de 2005, deixando sobrevivos todos os familiares referidos e ainda

os seus pais – Xavier e Zulmira – e um irmão – Gustavo.

Proceda à partilha da herança de António, sabendo que António faleceu intestado e deixou um

património avaliado em 110.000 Euros e dívidas no valor de 20.000 Euros.

***

São herdeiros legitimários: o cônjuge (B), os descendentes (C, D, E e F) e os ascendentes (X e Z) –

2157. G não é herdeiro legitimário, pelo que fica desde logo excluído.

Ex vi do art. 2157, aplicam-se a ordem e as regras da sucessão legítima:

2133/1-a: a primeira classe de sucessíveis é composta pelo cônjuge (B) e pelos descendentes (C, D,

E e F); a segunda classe é formada pelo cônjuge (B) e pelos ascendentes (X e Z).

2134: os da primeira classe preferem aos das seguintes. Logo, são chamados à sucessão legiti maria

B, C, D, E e F.

2162: cálculo do valor total da herança (VTH): R+D-P=VTH

R = 110.000; D = 0; P = 20.000

Logo, R(110.000) + D(0) – P(20.000) = 90.000

Cálculo da Quota Indisponível (QI):

2159/1: em caso de concurso, a legítima do cônjuge e dos filhos é de 2/3 da herança.

Mapa da partilha:

QI = 60.000 (90.000 x 2/3) QD = 30.000 (90.000 – 60.000)

B = 15.000

2157, 2133/1-a, 2134, 2135, 2136 e 2139/1 B = 7.500

2132, 2133/1-a, 2134, 2135, 2136 e 2139/1

C = 11.250

2157, 2133/1-a, 2134, 2135 e 2136 C = 5.625

2132, 2133/1-a, 2134, 2135, 2136

D = 11.250

2157, 2133/1-a, 2134, 2135 e 2136 D = 5.625

2132, 2133/1-a, 2134, 2135, 2136

E = 11.250

2157, 2133/1-a, 2134, 2135 e 2136 E = 5.625

2132, 2133/1-a, 2134, 2135, 2136

F = 11.250

2157, 2133/1-a, 2134, 2135 e 2136 F = 5.625

2132, 2133/1-a, 2134, 2135, 2136

2.º Caso (Nº 54)

Em 1985, Carlos doou a Diogo 110.000 Euros.

G

C D E F

A

c

B

X

c

Z

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 54)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

3

Em 1986, Carlos casou com Engrácia, tendo celebrado previamente convenção antenupcial, na

qual outorgou, para além dos esposados, Florbela, a quem Carlos doou por morte 1/8 da sua

herança.

Em 1990, Carlos fez testamento público, deixando à sua amiga Glória uma mota BMW, no

valor de 20.000 Euros, e deixando a Hugo, marido de Isa, notária que lavrou o testamento, uma

pintura a óleo, no valor de 5.000 Euros.

Em 1999, Carlos doou a Isa 40.000 Euros.

Em 2004, Carlos falece, deixando sobrevivos os seus pais, João e Luísa, e o seu irmão, Miguel,

além dos demais intervenientes na hipótese.

O património de Carlos foi avaliado em 200.000 Euros, tendo deixado débitos no valor de

20.000 Euros.

Tendo em conta os dados referidos, proceda à partilha da herança de Carlos.

***

1. Temos de começar, em primeiro lugar, por analisar cada uma das figuras jurídicas que são

apresentadas no texto:

1.1. 1985 – Doação em vida (DV) de 110.000 a favor de D;

1.2. 1986 – Pacto sucessório (PS) designativo a favor de F. Rege aqui o art. 2028 e os

arts. 1701

e 1702, sendo que com esta acção C institui como herdeira F.

1.3. 1990 – Deixa testamentária da Mota de 20.000 a favor de G – legado (DTL).

1.4. 1990 – Deixa testamentária da pintura – Legado (DTL). Neste caso a disposição

testamentária era nula, pois considera-se feita à notária que lavrou o testamento

(Isa) por interposta pessoa (seu marido Hugo) – arts. 2197, 2198/1-2 e 579/2 CC).

JDP considera que não estamos aqui perante uma verdadeira incapacidade, mas

antes de uma ilegitimidade.

1.5. 1999 – Doação em vida de 40.000 a favor de I. Caso tivesse sido I a notária a fazer

a escritura, esta doação poderia ser considerada nula (arts. 2197 e 953). Nesse

caso, haveria que somar este valor ao Relictum, pois tudo se passaria como se os

40.000 não tivessem saído da esfera patrimonial de C. No entanto, o que se diz no

texto é que ela foi a notária que lavrou o tstamento e não a escritura de doação,

pelo que vamos considerar a DV válida.

2. Temos herdeiros legitimários (arts. 2157, 2133/1-b e 2, 2134 e 2135).

3. Haverá pois que calcular a legitima (arts. 2162 e 2142).

R = 200.000;

D = 150.000

M

D F G

J

c

L

C

c

E

H

c

I

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 50)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

4

O Donactum é o resultado da soma das doações em vida e das despesas sujeitas à

colação (2162, 2110). Não existindo despesas de colação, temos: 110.000+40.000=150.000.

P = 20.000

R + D – P = VTH. Logo, 200.000 + 150.000 – 20.000 = 330.000

QI = 330.000 x 2/3 = 220.000 (2161)

Mapa da partilha:

QI = 220.000 (330.000 x 2/3) QD = 110.000 (330.000 – 220.000)

E = 146.666

2157, 2133/1-b, 2134, 2135, 2136 e

2142/1

D = 110.000

(DV)

J = 36,667

2157, 2133/1-b, 2134, 2135, 2136 e

2142/1

F = 27,500

R (200.000)+Dp(40.000)-P(20.000) =

VTH(220.000) – art. 172

220.000 x 1/8 = 27,500 (PS)

1

L = 36,667

2157, 2133/1-b, 2134, 2135, 2136 e

2142/1

G = 20.000

(DTL)

H = 0

Deixa é nula (DTL)

I = 40.000

(DV)

197,500

Total das liberalidades ultrapassa a QD em

87,500. Há que reduzir por inoficiosidade

2168

: C poderia dispor de 110.000, mas dispôs de 197.500. Inoficiosidade = 87.500).

2171

: Redução por inoficiosidade: ordem:

Disposiões testamentárias;

Legados

Doações em vida (e mortis causa2).

4. Assim, parece-nos que a ordem de redução será a seguinte:

1ª – Legado da mota no valor de 20.000. Resta inoficiosidade de 67.500;

2ª – Doação de 40.000 a I, por ser a última DV (2173). Resta inoficiosidade de 27.500;

3ª – PS a favor de F no valor de 27.500, (doação mortis causa, a que se aplica, por

analogia, o regime das doações em vida para efeitos do Art. 2171 (2173). Esta última

redução faz com que as liberalidades se contenham dentro das forças da QD.

3.º Caso (Nº 50)

António, em 5 de Dezembro de 2001, dispôs em testamento cerrado:

1

Pamplona Corte Real, ao contrário de Jorge Duarte Pinheiro, não abate o passivo.

2

O art. 2171
apresenta uma lacuna relativamente aos pactos sucessórios – doações mortis causa

– pelo que

vamos aplicar o regime das doações em vida por analogia atenta uma certa similitude quanto ao regime

revogatório; note-se que o

art. 1701

revela que não podemos prejudicar os PS com doações posteriores.

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 50)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

5

“1. Deixo os meus bens presentes a Bento, meu irmão;

2. Deixo os meus bens futuros a Carla, minha prima.”

António faleceu em 5 de Janeiro do ano seguinte, tendo-lhe sobrevivido, para além dos

parentes acima referidos, a sua irmã Joana.

Qualifique as deixas efectuadas por António.

***

1. Os “bens presentes” podem ser enquadrados no conceito de “deixas categoriais ou

dicotómicas” que, em conjunto com os “bens futuros” esgotariam a totalidade da herança.

B seria, assim, herdeiro e não legatário. Apesar de Oliveira Ascensão não aceitar esta

qualificação, dizendo que os bens presentes são determinados ou determináveis, não sendo

a deixa susceptível de variação que é característica das deixas a título de herança, nem o

Prof. Pamplona Corte Real nem J. Duarte Pinheiro aceitam este critério da “variabilidade”

dos bens como relevante para a distinção herdeiro/legatário. O importante é que as deixas

categoriais ou dicotómicas esgotem a totalidade da herança, funcionando cada qual como

o remanescente dos bens a que se refere o art. 2030/2 CC.

Assim, e em conclusão, estamos perante deixas testamentárias a título de herança e não de

legados, quer no caso dos bens presentes quer no dos bens futuros.

2. Os “bens futuros”, ao contrário dos “bens presentes”, não oferecem já obstáculo à

qualificação como deixa a título de herança, precisamente porque dotada da variabilidade

e indeterminação. C é herdeira.

Cálculo da herança:

2157: Não existem herdeiros legitimários

2132: são herdeiros legítimos o cônjuge, os parentes e o Estado.

2133/1-c: os irmãos e seus descendentes integram a terceira classe de sucessíveis

2134, 2135: os irmãos, B e J, preferem aos respectivos descendentes; e preferem também a C,

colateral de A no 4º grau, que se enquadra na quarta classe de sucessíveis.

Contudo, a sucessão testamentária tem precedência sobre a sucessão legítima. Os bens seriam,

assim, distribuídos entre B e C, cabendo ao primeiro os bens existentes à data do testamento e

a C os bens que vieram ao património do autor após essa data.

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 52)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

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4.º Caso (Nº 52)

A

rtur faz testamento cerrado, no qual estipula:

“1. Deixo 1/3 da minha herança a

B

enjamim e quero que esse 1/3 seja preenchido com o meu

barco de recreio e com a casa de férias na Madeira;

2. Deixo a casa em Sesimbra a

C

armen, sendo o valor desse bem correspondente a 1/3 do

meu património;

3. Deixo de usufruto a

D

avid 1/3 da minha herança;

4. O remanescente ficará para

E

duarda.”

1. Caracterize as deixas testamentárias, supondo que:

a) o valor do barco e da casa de férias é inferior a 1/3 d herança;

b) o valor desses bens é superior a 1/3;

c) o valor da casa de Sesimbra é superior a 1/3 do património;

d) o valor dessa casa era inferior.

2. Suponha agora que quando Artur morre apenas tem a casa em Sesimbra. Como qualifica

a deixa a C? E qual o valor das outras deixas?

3. Suponha ainda que o autor da sucessão, no testamento, afirmou que deixava a David o

usufruto de 1/3 da sua herança, mas quer que ele responda pelas dívidas. Quid juris?

***

1. Caracterização das deixas testamentárias:

a) Trata-se da figura da herança ex re certa (alguém sucede em bens determinados sendo

tido como herdeiro), mais propriamente legado por conta da quota (o de cuius atribui

um bem determinado para preencher uma quota, neste caso testamentária).

O B deve ser tido como herdeiro (segundo a posição do Prof. PCR, devemos optar

pelo regime de maior relevo na estruturação do fenómeno sucessória – pag. 27 do livro

do Prof. Jorge Pinheiro). Como o valor dos bens fica aquém do valor da cota ele pode

exigir a diferença.

b) Neste caso ele deve ser tido como herdeiro por conta da quota até ao limite do valor da

quota e legatário quanto ao valor dos bens em excesso. Não tem de devolver.

c) Pode colocar-se aqui a questão da interpretação do testamento. O art. 2187 consagra

uma orientação subjectivista, visa a detecção da vontade presumível do testador no

momento da morte. Duas maneiras de ver esta interpretação:

Legado por conta da quota, e nesse caso, quer na hipótese c) quer na d) a solução é

idêntica à de cima, se a casa vale mais, ele é legatário até ao limite do valor do bem e

herdeiro quanto ao resto; se a casa vale menos, ele tem direito a receber a diferença até

ao 1/3.

– Legado em substituição da quota

: este caso (art. 2165

) consiste numa disposição

mortis causa

de bens determinados cuja aceitação pelo beneficiário implica a não

aquisição da quota testamentária em que ele teria o direito de suceder. Se ele aceita o

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 52)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

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legado então não sucede na quota; é um simples legatário e só pode reclamar os bens

determinados que lhe foram atribuídos.

No presente caso estamos no âmbito do art. 2030/4, o que implica a qualificação de C

como legatária.

d) O que se disse para a alínea c) tem aqui plena aplicação. A solução seria a da alínea b)

caso se considerasse que se tratava de um legado por conta da quota.

As outras deixas:

Deixa 3: Trata-se de um legado e D é sempre tido como legatário ex vi do Art. 2030/4

CC. E isto independentemente de o usufruto respeitar a bens especificados ou à

herança no seu todo ou a uma quota desta.

Deixa 4: Trata-se de herança, nos termos do Art. 2030/3 CC, uma vez que os bens

correspondentes ao “remanescente da herança” não estão especificados.

2. Em primeiro lugar, há que verificar o que sucede em relação às outras deixas. Assim, a

primeira seria nula (art. 2254/1 – legado de coisa inexistente no património do autor) e a

quarta é a chamada de herança vazia. Quanto ao usufruto a favor de D, referindo-se o

mesmo a 1/3 da herança e sendo esta composta apenas pela casa de Sesimbra, signfica que

o usufruto vai incidir sobre 1/3 dessa casa.

Quanto à qualificação de C como herdeira ou legatária, tudo depende do ponto de vista

doutrinário adoptado.

a) Para Pamplona Corte Real, C seria herdeira uma vez que a deixa testamentária de que

é beneficiária esgota as forças da herança. Ela sucede na totalidade dos bens

existentes, não tendo qualquer significado as heranças vazias;

b) Já Oliviera Ascensão, pelo contrário, entende que as heranças vazias continuam a ter

signficado. Isto advém da posição deste autor que considera que o principal traço

distintivo entre o herdeiro e o legatário é o facto de o primeiro ser o “sucessor pessoal”

do autor da herança, havendo, por conseguinte, certos poderes que só ele pode exercer.

Jorge Duarte Pinheiro não concorda com esta visão do herdeiro como sucessor pessoal

do de cujos.

Adere-se, assim, à posição que considera C como herdeira na situação descrita.

3. Regra geral, é ao herdeiro que cabe a responsabildiade pelos encargos da herança (2068 e

2071). Contudo, nos termos do Art. 2072/1, o usufrutuário da totalidade ou de uma quota

do património do falecido pode adiantar as somas necessárias, conforme os bens que

usufruir, para cumprimento dos encargos da herança, ficando com o direito de exigir dos

herdeiros, findo o usufruto, a restituição sem juros das quantias que despendeu. Se o não

fizer, pode o herdeiro, nos termos do nº 2 do mesmo artigo, exigir que dos bens usufruídos

se vendam os necessários para cumprimento dos encargos, ou pagá-los com dinheiro seu,

ficando neste úDTLimo caso, com o direito de haver do usufrutuário os juros

correspondentes.

Vemos, assim, que o usufrutuário tem já a responsabilidade legal de arcar com parte dos

encargos da herança, mas apenas no que respeita aos juros das quantias necessárias para o

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 55)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

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efeito. E isto apenas nas relações internas com os herdeiros, uma vez que nas relações

externas é sempre da responsabilidade destes responder pelos encargos da herança.

O que o testedor erstá a fazer, ao instituir esta cláusula, é a alterar o estatudo do legatário

num dos pontos essenciais e que descaracterizariam tal estatuto levando à alteração da

qualificação. Ora, isso não é permitido…

5.º Caso (Nº 55)

Em 1980,

A
ida fez testamento público, deixando a B

aco, seu irmão, o seu barco “Paraíso”,

no valor de 25.000 Euros e a

C

aetano, padre da sua paróquia, 1/10 da quota disponível.

Nesse mesmo testamento, Aida declara ser mãe de

Z

ulmira, cujo registo de maternidade

estava omisso.

Em 1984, Aida doou 15.000 Euros a

D

iana.

Em 1985, Aida e Edgar casaram, tendo celebrado previamente convenção antenupcial, na

qual Aida doou mortis causa a

F

elícia, que aceitou, 1/5 da sua herança e doou mortis

causa a

G

uiomar o seu barco “Paraíso”.

Do casamento de Aida e

Edgar nasceram quatro filhos – Hugo, Ivo, Jorge e L

uís.

Em 2000, Aida doou a

M

iguel 30.000 Euros.

Em 2001, foi decretada a separação judicial de bens entre Aida e Edgar.

Sabendo que Aida morreu em 2003 e deixou bens no valor global de 260.000 Euros e

débitos no valor de 5.000 Euros, proceda à partilha da herança de Aida.

***

1. Classificação das deixas:

a) 1980: a favor de B (barco “Paraíso” = 25.000) – DTL. Verificou-se revogação tácita

desta DTL pelo PS de 1985, no qual A doou o mesmo bem mortis causa a pessoa

diferente (G) – 2313 (caso a donatária tivesse intervido no acto, tratar-se-ia de um

verdadeiro PS designativo, que implicaria a aplicação do regime dos Arts. 1705,

1701 e 1702. Nesse caso, a revogação seria real, nos termos do art. 2316 CC);

b) 1980: a favor de C (1/10 da QD) – DTH (deixa testamentária a título de herança);

c) 1984: a favor de D (15.000) – DV;

d) 1985: a favor de F (1/5 da herança) – PS designativo (doação mortis causa, uma vez

que interveio no acto e aceitou a doação – 1705, 1700 e 1701);

e) 1985: a favor de G (barco “Paraíso” = 25.000) – DTL (apesar de ter adoptado a

forma de doação mortis causa na convenção antenupcial, uma vez que a donatária

B

Z H I J L

A

c

E

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 55)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

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não interveio no acto, a doação adquire carácter testamentári o, nos termos do art.

1704);

f) 2000: a favor de M (30.000) – DV

O art. 2179 permite que o testamento possa comportar negócios não patrimoniais,

nomeadamente a declaração de maternidade. O estabelecimento da maternidade tem efeitos

retroactivos pelo que Z já era filha de A à data da morte desta.

2. Herdeiros legitimários: o cônjuge (E) e os descendentes (Z, H, I, J e L) – 2157, 2133/1-a,

2134-2135

3. Partilha da herança: sucessão legitimária

R = 260.000 D = 45.000 P = 5.000

R + D – P = VTH (2162)

260.000+45.000-5.000=300.000

QI: 300.000 x 2/3= 200.000 (2159/1)

QD: 300.000-200.000=100.000

4. Mapa da partilha:

QI = 200.000 (300.000 x 2/3) QD = 100.000 (300.000 – 200.000)

E = 50.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 B = 0

(DTL) revogação real (2316/1 )

Z = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 C = 10.000

(DTH) 100.000x1/10=10.000; reduzida na

totalidade por inoficiosidade

H = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 D = 15.000

(DV)

I = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 F = 57.000 (PS) 1/5 herança (1

)

J = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 G = 25.000

(DTL) Reduzida na totalidade por

inoficiosidade (não é verdadeiro PS por o

donatário não ter tido intervenção)

L = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 M = 30.000

(DV), reduzida a 28.000 por inoficiosidade

137.000

Há inoficiosidade de 37,000

(1)

R + Dp – P = VTH; 260.000+30.000-5.000=285.000; 285.000 x 1/5 = 57.000 (Art. 1702)

(2030/2, 1700, 1705, 1701-1702)

Nota:

nem a fórmula de cálculo da sucessão contratual (R+Dp–P=VTH) nem a da

sucessão legal (R+D–P=VTH) são aplicáveis à sucessão testamentária, que tem uma

fórmula mais simples: R–P=VTH

Ordem da redução da inoficiosidade: 2171 – 1º Deixas testamentárias, 2º Legados, 3º

Doações em vida (inclui doações mortis causa). Assim:

1º – Reduzimos na totalidade a deixa testamentária a favor de C, no valor de 10.000. Resta

inoficiosidade de 27.000;

2º – Reduzimos na totalidade a DTL a favor de G, no valor de 25.000. Resta inoficiosidade

de 2.000;

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 56)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

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Nota

: Caso houvesse mais do que um legado haveria que reduzi-los proporcionalmente.

Para isso, usaríamos a regra de três simples.

Ex. do Prof. JDP:

VT legados = 80 — inoficiosidade = 40;

DTL(1) = 60 — Valor da redução (VR) = ? (60 x 40) / 80 = 30

VT legados = 80 — inoficiosidade = 40;

DTL(2) = 20 — Valor da redução (VR) = ? (20 x 40) / 80 = 10

No exemplo dado o legado de 60 seria reduzido a 30 e o de 20 seria reduzido a 10.

3º – A DV a favor de M, por ser a última (2173), é reduzida em 2.000, ficando com o valor

de 28.000.

O mapa final da partilha fica, assim:

QI = 200.000 (300.000 x 2/3) QD = 100.000 (300.000 – 200.000)

E = 50.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 B = 0

(DTL)

Z = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 C = 0

(H) Reduzida na totalidade

H = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 D = 15.000

(DV)

I = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 F = 57.000

(PS)

J = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 G = 0

(PS) reduzida na totalidade

L = 30.000

2136 e 2139/1 ex vi 2157 M = 28.000

(DV) Reduzida em 2.000

6.º Caso (Nº 56)

A

nabela, filha de Carlota e Daniel, casou, em 1993, com B

ernardo. Porém, o casamento

não correu bem e, em Janeiro de 1999, Anabela e Bernardo separaram-se de facto.

Em Julho de 2001, Anabela fez doação a Carlota do seu anel de noivado, que só lhe trazia

más recordações de Bernardo.

Em Maio de 2004, Anabela faz testamento cerrado, onde dispôs o seguinte:

“1. Deixo o meu violino a Bernardo, única pessoa que conheço que sabe a importância de

um violino, e que certamente lhe dará um uso apropriado;

2.Deixo ao meu pai a minha colecção de canetas;

3. Deixo a

E

urico, meu único primo de família paterna, o álbum de fotografias de família,

porque entendo que deve ser perpetuado de geração em geração dentro da família;

4. Deixo a

F

ernando o meu computador portátil, com a base de dados de todos os meus

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 56)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

11

clientes.”

Anabela faleceu em Janeiro de 2005.

Após a sua morte, descobre-se que, afinal, Eurico não era seu primo, mas sim José, filho de

uma relação extraconjugal de seu tio. Prova-se ainda que a mulher de Fernando, chefe de

trabalho de Bernardo, tinha ameaçado Anabela que se esta não deixasse o seu portátil e a

base de dados de clientes ao seu marido, iria prejudicar Bernardo na sua actividade

profissional.

1. Proceda à partilha da herança de Anabela, sabendo que esta deixou bens no valor de

97.000 Euros, dívidas no valor de 10.000 Euros, o anel de noivado foi avaliado em

3.000 Euros, a colecção de canetas em 5.000 Euros, o álbum de fotos em 1.000 Euros e

o violino em 500 Euros.

2. Imagine agora que, em 2002, Bernardo é condenado por denúncia caluniosa de Daniel,

facto que indignou profundamente Anabela. Como procederia à partilha da herança de

Anabela?

***

Resposta à questão 1:

1. Classificação das deixas:

1.1. 2001: a favor de C

2

(anel de noivado = 3.000) – DV – 2030/2

1.2. 2004: a favor de B (violino = 500) – DTL (2030/2). Não há que fazer imputação,

considerando-se a deixa como um pré-legado, valendo por inteiro (2264)

1.3. 2004: a favor de D (canetas = 5.000) – DTL (2030/2). Também não há lugar a

imputação, por ser pré-legado, valendo por inteiro (2264)

1.4. 2004: a favor de E (álbum de fotografias = 1.000) – DTL (instituído legatário por

erro)

1.5. 2004: a favor de F (computador = ?) – DTL (obtida sob coacção moral)

2. R = 97.000 D = 3.000 P = 10.000

3. Partilha da herança:

3.1. Sucessão legitimária:

?

A

c

B

D

c

C

E J

F

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 56)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

12

Há herdeiros legitimários: o cônjuge (B) e os ascendentes (D e C) – 2157 e 2133/1-b. A

separação de bens – mesmo judicial – não afasta o cônjuge da herança, ao contrário do

divórcio e da separação de pessoas e bens (2133/3 a contrario).

Assim, há que calcular a legítima (VTH) nos termos do Art. 2162: R + D – P = VTH

97.000 + 3.000 – 10.000 = 90.000

QI: 90.000 x 2/3 = 60.000 (2161/1)

QD: 90.000 – 60.000 = 30.000

Legítima subjectiva do cônjuge e dos ascendentes (2142/1):

B: 60.000 x 2/3 = 40.000;

D: (60.000 x 1/3) / 2 = 10.000;

C: (60.000 x 1/3) / 2 = 10.000.

Mapa da partilha:

QI = 60.000 (90.000 x 2/3) QD = 30.000 (90.000 – 60.000)

B = 40.000

2136 e 2142/1 ex vi 2157 C2 = 3.000

(DV)

D = 10.000

2136 e 2142/1 ex vi 2157 B = 500

(DTL)

C = 10.000

2136 e 2142/1 ex vi 2157 D = 5.0000

(DTL)

E = 0

(DTL) álbum = 1.000: anulável por erro

sobre os motivos

(1)

. Resulta do próprio

testamento a essencialidade do erro (2202)

F = 0

(DTL) Computador: anulável por coacção.

O erro é essencial e o mal grave e

justificado o seu receio (2201, 255 e 256)

B = 14.333

A título de sucessão legítima

D = 3.583

A título de sucessão legítima

C = 5.383

A título de sucessão legítima

(1)

Oliveira Ascensão defende que sempre que o erro recaia sobre os motivos na indicação da

pessoa ou dos bens deverá ser aplicável o art. 2203 e não o 2202. A aplicação deste último

deverá ser limitada ao erro sobre os motivos stricto sensu. Contudo, PCR não concorda e

diz que deve ser aplicado o 2202, porque no 2203 admite-se prova complementar enquanto

naquele tal prova não é admissível.

Assim, segundo Oliveira Ascensão, não seria E a ser beneficiado mas sim J; pela

perspectiva de PCR (que é aceite e defendida por JDP) nenhum deles é beneficiado, sendo a

deixa nula. É esta a posição a que aderimos.

Anulação da deixa do computador por coacção: relevância do facto de a coacção provir de

terceiro e não do beneficiário: será aplicável o art. 2201?

Será de defender a sua aplicação desde que estejam reunidos os requisitos do art. 255 e 256.

No caso vertente parece não restarem dúvidas que assim é, sendo a deixa anulável dentro do

prazo de 2 anos (2308/2).

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 56)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

13

Importa, agora, calcular a sucessão legítima:

Valor da herança para efeitos de sucessão legítima:

30.000 – 8.500 = 21.500

2132 – são sucessíveis legítimos o cônjuge, os parentes e o Estado, pela ordem e segundo as

regras dos arts. 2133 e ss.

2133/1-b – não existem sucessíveis que prefiram ao cônjuge e aos ascendentes

2136 e 2142/1: o cônjuge tem direito a 2/3 e os ascendentes a 1/3, logo

B = 14.333;

D = (21.500-14.333) / 2) = 3.583

Resposta à questão 2:

I – A situação poderá enquadrar-se no âmbito do Art. 2034/b, caso o crime caluniosamente

denunciado seja punido com pena superior a 2 anos, dado este omisso no texto.

O texto diz-nos que ele foi condenado em 2002, sendo que a abertura da sucessão se deu em

2005. Vemos que, nos termos do Art. 2035/1, a condenação pode ser posterior, desde que o

crime seja anterior à abertura da sucessão. Vemos que aqui o crime foi anterior, pelo que a

condenação é relevante.

Problema pode levantar-se no que se refere ao prazo para a acção de indignidade que é, nos

termos do Art. 2036: de dois anos a contar da abertura da sucessão; ou de um ano a contar

da condenação ou do conhecimento das causas de indignidade. Ora, o texto diz-nos que A

ficou profundamente indignada, mas não que moveu a acção de indignidade dentro do prazo

de um ano a contar da condenação, que data de 2002. Será a acção judicial de declaração de

indignidade sempre exigível ou poderá a indignidade operar automaticamente verificadas as

situações previstas nas quatro alíneas do art. 2034?

Oliveira Ascensão, no entanto, defende que a indignidade só não opera automaticamente

quando o indigno está na posse dos bens.

PCR, por seu lado, diz que a posição de OA não faz sentido, sob pena de se pôr em causa a

segurança jurídica. Poderia admitir-se o funcionamento automático das alíneas a) e b) d art.

2034, uma vez que aí há certeza jurídica resultante da condenação, mas não nas duas

últimas. Conclui que, em nome da segurança jurídica, é de exigir sempre a acção judicial de

declaração da indignidade, o que parece fazer todo o sentido.

No caso vertente não é possível, como referimos já, afirmar convictamente que tal acção de

indignidade não tenha sido interposta no devido prazo e a indignidade judicialmente

declarada. E não se contraponha que não faria sentido que, depois de mover a acção de

indignidade, seria irracional que A contemplasse B no seu testamento. Veja-se que, nos

termos do Art. 2038/1, o indigno pode ser reabilitado, readquirindo a capacidade sucessória,

se o autor da sucessão expressamente o reabilitar em testamento ou escritura pública. Não foi

o que se passou neste caso, pois A não reabilitou “expressamente” B, pelo que ele não

readquiriu a capacidade sucessória plena, mas o facto de ter sido contemplado com o legado

do violino confere-lhe capacidade para suceder dentro dos limites desse legado (2038/2).

Sucessões: I – Sucessões

[Caso ditado (1)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

14

II – Admitindo que B tivesse sido judicialmente declarado indigno, e não tendo sido ele

reabilitado, a incapacidade para suceder derivada de tal declaração implicaria o recalculo da

legítima, embora não afectasse o legado do violino.

Face à indignidade de C, a parte que lhe caberia acresce em partes iguais às quotas dos

ascendentes D e C.

7.º Caso ditado (1)

João sofre um grave acidente de automóvel e, encontrando-se impossibilitado de escrever,

pede a Paulo, seu irmão, que é médico, para escrever por ele o seu testamento do qual

constam as seguintes cláusulas:

a) Uma vez que não tenho herdeiros legitimários, quero que os meus bens sejam

divididos em partes iguais pelo meu irmão Paulo e pela minha namorada;

b) Meu amigo Guilherme ficará com a minha colecção de moedas.

João vem a morrer no hospital em consequência do acidente, onde foi assistido por Paulo,

tendo deixado três irmãos sobrevivos: Paulo, Márcia e Susana, e deixa também duas

namoradas: a Ana e a Lina.

O valor da herança, descontado o valor do legado a favor de G, é de 600.

Quid juris?

***

I – Tipo de testamento.

Estamos perante um testamento cerrado (2204 e 2206), que pode ser celebrado por quem

souber escrever (2208), embora não possa assinar (2206/2). Note-se que, embora o art.

2206/2 refira igualmente que o testador pode deixar de assinar quando “não saiba” fazê-lo, a

doutrina dominante defende uma interpretação abrogante desta norma pois não é racional

defender que uma pessoa que sabe ler não saiba assinar.

O testamento pode ser escrito pelo próprio testador ou por pessoa a seu rogo (2206/1).

Provando-se que J sabia ler e assine – ou mencione que não assina por não o poder fazer,

nomeadamente por impossibilidade física – o testamento é válido.

O testamento cerrado está sujeito a aprovação por notário (2206/4 e 106-108 CNot). A data

da aprovação é a data do testamento.

II – Qualificação e análise das deixas testamentárias.

A primeira disposição é deixa testamentária a título de herança, já que quer P quer a

namorada de J são beneficiadas com uma quota correspondente a metade da herança, que

esgotam a sua totalidade (2030/2).

Quanto à segunda disposição, trata-se de uma deixa a título de legado, uma vez que se

refere a um bem concreto (2030/2).

III – Questão da indisponibilidade relativa de P.

Levantam-se aqui diferentes problemas de indisponibilidade relativa no que se refere a P,

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 58)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

15

uma vez que ele não só foi o médico que assistiu o autor relativamente aos ferimentos de

que viria a morrer (2194) como ainda para mais foi interveniente no testamento (2197).

A primeira causa de indisponibilidade relativa – o facto de ter sido o médico que assistiu o

autor – seria excepcionada pelo art. 2195/b e 2192/3 CC, dado P ser irmão de J. Porém, no

que se refere à segunda causa já não encontramos qualquer norma que a excepcione, pelo

que a disposição testamentária a favor de P é nula por violação do art. 2197. a acção de

nulidade do testamento teria de ser intentada no prazo de 10 anos, sob pena de caducidade

(2308/1).

IV – Problema de haver duas namoradas.

Entramos aqui no campo da interpretação do testamento (2187), que se rege pelos seguintes

princípios:

1) Interpretação segundo a vontade subjectiva do testador;

2) Interpretação tem de atender ao contexto do testamento;

3) Admite-se o recurso a elementos complementares externos ao testamento;

4) Tem que ser respeitado o limite formal.

No presente caso, não existem, quer no contexto do testamento, quer mesmo recorrendo a

elementos complementares externos a este, quaisquer possibilidades de tornar certo a qual

das namoradas se refere a deixa testamentária.

Note-se que não há lugar a integração de lacunas do testamento no que se refere a elementos

essenciais, mas apenas a aspectos instrumentais. E a instituição de herdeiro é, nos termos do

art. 2182/1, um elemento essencial. Logo, por força do art. 2185, esta deixa é também nula.

A acção de nulidade terá de ser intentada no prazo de 10 anos estabelecido pelo art. 2308/1,

sob pena de caducidade.

V – Sucessão legítima.

Sendo ambas as disposições testamentári as a título de herança nulas, abre-se a sucessão

legítima (2131). Concorrem a esta sucessão os irmãos do autor, P, M e S, sendo que o

primeiro é irmão germano, a segunda irmã uterina e a última irmã consanguínea.

Segundo o disposto no art. 2146, o quinhão dos irmãos germanos é o dobro dos irmãos

uterinos ou consanguíneos. Assim, temos:

P = 2 partes (600 / 4) x 2 = 300

M = 1 parte 600 / 4 = 150

S = 1 parte 600 / 4 = 150

Total: 4 partes

8.º Caso (Nº 58)

Ana casou com Bruno no regime de separação de bens e deste casamento nasceram quatro

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 58)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

16

filhos: Cátia, Diogo, Edgar e Filipe.

Em 1997, Ana doa em vida à sua filha Cátia a sua casa de Sintra. No ano seguinte, doa em

vida ao seu filho Diogo a sua casa no Porto.

Bruno, gravemente doente há vários anos, falece em 1979.

Em 1980, Ana faz testamento cerrado, estipulando o seguinte:

“1. Deixo a minha filha Cátia o meu anel de noivado e, caso esta não queira aceitar,

quero que fique para a minha afilhada Joana.

2. Deixo a Xavier a minha conta bancária a prazo no Banco Saco Azul e, por morte

deste, deverá reverter para Zulmira.”

Em 1995, Cátia é deserdada por Ana, por ter sido condenada por denúncia caluniosa

contra Bruno, seu pai.

Em 1996, ao saber que não tinha sido contemplado no testamento de sua mãe, Diogo, a

única pessoa a conhecer da sua existência, esconde-o.

Em 1997, Ana doa em vida a Filipe o seu Ferrari, mencionando expressamente que o

pretendia avantajar.

Em Abril de 2003, Ana falece num grave acidente de viação.

Proceda à partilha da herança de Ana, sabendo que:

Cátia,

casada com Gonçalo, tinha dois filhos, Ivo e Hugo, tendo este último sido

declarado indigno face à sua mãe, por ter destruído o testamento que esta havia feito;

Edgar

repudia;

Em

Março de 2003, Xavier tem um acidente, ficando em estado de coma, até Julho de

2003, data da sua morte, deixando sobrevivo apenas o seu filho Vasco;

Joana

havia falecido em 2000;

Ana

deixa bens no valor de 65.000,00 euros, sendo que, no momento da abertura da

sucessão, a casa de Sintra foi avaliada em 60.000,00 euros, a casa do Porto em

50.000,00 euros, o anel de noivado em 1.000,00 euros, a conta bancária em 15.000,00

euros e o Ferrari em 5.000,00 euros.

***

Segundo as orientações dadas, o caso vai ser resolvido em duas fases: primeiro só será

abordada a matéria da vocação indirecta ignorando as questões atinentes à colação;

G

c

C

A c B

D E

I

F

H

J

X

C

V

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 58)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

17

posteriormente será então resolvido definitivamente, tendo já em consideração a matéria

ignorada na primeira fase.

Não se deve confundir a «vocação indirecta» com a «vocação subsequente»: a primeira

prevalece sobre a segunda.

Verifica-se uma hierarquia entre os varios tipos de vocações, que varia consoante os títulos

sucessórios. Assim, temos:

Na sucessão legal (legítima e legitimária):

o Direito de representação (2138)

prevalece sobre o Direito de acrescer (2137/2). Onde houver direito de representação

não terá aplicação o direito de acrescer. Aqui não há lugar à substituição directa.

Na sucessão voluntária (contratual e testamentária):

1º Substituição Directa, 2º

Substituição por representação, 3º Direito de Acrescer.

A – Sumário da matéria de facto.

1970:

DV a favor de C da casa de Sintra (60.000) – visto vigorar o regime de separação de

bens qualquer dos cônjuges tem legitimidade para alienar ou onerar bens imóveis de que seja

proprietário, desde que não se trate de casa de morada de família (1682-A);

1971

: DV a favor de D da casa do Porto (50.000) – idem;

1979

: B falece. Logo, não entra na sucessão de A pois é pré-morto;

1980

: Testamento cerrado (2204). Institui legatários (2030/2):

a) DTL a favor de C (anel de noivado = 1.000); se C não aceitar, fica para J:

substituição directa para o caso de não querer aceitar – 2281 ex vi 2285; a substituição

directa prevalece sobre o direito de representação e sobre o acrescer – 2041/2-a CC.

b) DTL (legado de crédito – 2261) a favor de X (conta bancária = 15.000); por morte

de X, passa para Z: “diz-se substituição fideicomissária a disposição pela qual o

testador impõe ao herdeiro, o encargo de conservar a herança, para que ela reverta por

sua morte, a favor de outrem” – 2286;

1995

: C é deserdada 2166/1-b: a deserdação tem que ser feita em testamento, mas como o

texto nada nos diz vamos pressupor que ela é válida.

São três os pressupostos da vocação (2032):

(1) Um título sucessório prevalente;

(2) Ter capacidade sucessória: situações de “não poder” aceitar. Abrange a

indignidade e a deserdação.

(3) A sobrevivência ao de cuius: situações de “não poder” aceitar. Abrange a prémorte,

a presunção de comoriência (58) e a declaração de morte presumida

(114)

A situação de “não querer” aceitar resume-se ao repúdio da herança (2062)

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 58)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

18

De acordo com o art. 2166º/2, o deserdado é equiparado ao indigno para todos os efeitos

legais. C está, assim, numa situação de “não poder” aceitar.

Ora, segundo o art. 2037º/2, a incapacidade sucessória na sucessão legal não prejudica o

direito de representação. Por interpretação a contrario sensu retira-se que na sucessão

testamentária o direito de representação é prejudicado pela incapacidade sucessória.

Sendo assim, H e I vão suceder a A (sua mãe), através do instituto do direito de representação

– art. 2039º, pois “na sucessão legal, o direito de representação tem sempre lugar na linha

recta em benefício dos descendentes de filho do autor da sucessão” – art. 2042º.

1996

: D esconde o testamento cerrado de A – indignidade: 2034/d e 2037/1

1997

: DV a favor de F (Ferrrari = 5.000) com intenção de avantajar, ou seja, que pretende que

o carro não esteja sujeito ao instituto da colação – art. 2113º.

2003

: Abertura da sucessão

B – Partilha.

I – Visto haver herdeiros legitimários: os quatro filhos C, D, E e F, todos sobrevivos, vamos

abrir a sucessáo legitimária abstraindo, por ora, das incapacidades de alguns dos herdeiros.

Quanto a B, cônjuge da autora da sucessão, verificámos que faleceu em 1979, muito antes da

abertura da sucessão (Abril de 2003). Logo, não podia este suceder por pré-morte: não está

verificado o pressuposto da existência.

Haveria substituição de B por representação? Não, porque o direito de substituição opera

apenas em favor dos “descendentes de um herdeiro ou legatário”, que são chamados a ocupar

a posição daquele que não pôde ou não quis aceitar a herança ou o legado (2039). Na sucessão

legal são chamados a ocupar esse lugar “os descendentes de filho do autor da sucessão e, na

linha colateral, em os descendentes de irmão do falecido, qualquer que seja, num caso ou

noutro, o grau de parentesco (2042). Assim, e em síntese, só há direito de representação a

favor de sobrinhos ou netos do autor.

Haverá direito de acrescer? Não há, porque a pré-morte, a comoriência e a declaração de

morte presumida não são pressuposto do direito de acrescer. Falecendo o cônjuge antes do

autor da sucessão, a legítima dos filhos será de metade ou de dois terços consoante haja um ou

mais de um (2159/2). Por exemplo, se três dos irmão morressem a legítima do sobrevivo seria

de metade da quota indisponível da herança; mas se pelo menos um dos irmãos deixar

descendentes, a legítima será de dois terços.

Conclusão: B não era chamado à sucessão legitimária. Mas se houvesse sucessão

testamentária, aí já haveria direito de representação.

2133/1-a, 2134-2135:

os descendentes são os herdeiros detentores de título prevalente

2162/1:

R + D – P = VTH

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 58)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

19

R = 65.000; D: 60.000 (casa Sintra) + 50.000 (casa porto) + 5.000 (Ferrari) = 115.000; P = 0

Nota: tanto o anel como a conta bancária não entram no cálculo, pois já estão incluídos no

Relictum

, de onde ainda não sairam por se tratar de deixas testamentárias.

R(65.000) + D(115.000) – P(0) = VTH(180.000)

2159/2:

QI = 120.000; QD = 60.000

2136 ex vi 2157:

120.000 : 4 = 30.000

II – Deserdação de C.

Caso não tivesse havido deserdaçãoconcluir-se-ia que cada um dos herdeiros legitimários

receberia bens no valor de 30.000,00 euros.

Vimos, porém, que C fora deserdada, estando assim numa posição de «não poder aceitar» a

herança. Recorde-se que a deserdação tem que constar do próprio testamento com indicação

expressa da causa.

Pergunta-se: caso A não tivesse deserdado C quando fez o testamento, poderia ainda assim ser

declarada a indignidade com base em causa de deserdação concomitante com a de indignidade

já conhecida do testador?

Em situações como a descrita considera Oliveira Ascensão que houve reabilitação tácita do

indigno, pelo que já não poderia haver decalração de indgnidae. PCR não concorda.

Por outro lado, note-se que a deserdação não pode ser parcial, embora possa ser condicional

(será deserdada se vier a ser condenada…).

Como constatámos acima, a declaração de indignidade não prejudica o direito de

representação na sucessão legal (2037/2), mas já o afasta na sucessão voluntária.

Por direito de representação, caberia a H e I tomar a posição de C (2039 e 2042). Cada um

receberia ½ da legítima que aquela caberia (15.000). Contudo, diz o texto que H é indigno

face a C, cuja posição deveria ocupar por representação. Será este facto impeditivo do direito

de representação?

A resposta é negativa: o H tem que ser capaz relativamente a A, independentemente de o não

ser em relação ao sucessível cuja posição veio ocupar por este não poder ou não querer aceitar

a herança (2043).

Conclusão: H e I eram capazes relativamente a A e não repudiaram a herança. Sucedem,

assim, na quota parte da herança em substituição de C.

III – Indignidade de D.

Diz-nos o texto que D escondera o testamento cerrado (2006) de A, por ver que não fora nele

contemplado.

Tal conduta vem a ser causa de indignidade, nos termos do art. 2034/1-d, mas discute-se se tal

causa opera ipso iure ou se impóe a necessidade de declaração judicial da indignidade.

Ora, embora Oliveira Ascensão defenda que a indignidade opera automaticamente, só se

tornando necessário o recurso à acção judicial se e quando o indigno estiver na posse dos

bens, para a maioria da doutrina é sempre necessário a declaração judicial, para cuja acção se

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 58)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

20

prevê um prazo de de dois anos a contar da abertura da sucessão ou dentro de um ano a

contar, quer da condenação pelos crimes que a determinam, quer do conhecimento das causas

de indignidade (2036).

Assim concluindo, e visto o texto ser omisso quanto a esta parte, não se poderia afirmar que D

tenha sido declarado indigno.

Contudo, para efeitos do exercício, vamos assumir que a indignidade tinha sido declarada, D

estaria numa situação de «não poder aceitar» a herança(3). E, visto não ter deixado

descendentes que o pudessem substituir por direito de representação, o valor da sua quota

acresceria à dos outros herdeiros nos termos do art. 2137/2.

Assim, o cálculo das legítimas subjectivas dariam os seguintes resultados:

E = 40.000; F = 40.000; H = 20.000 e I = 20.000

IV – Repúdio da herança por E.

Face ao efeito retroactivo do repúdio da herança, considera-se E como não chamado, salvo

para efeitos de representação (2062) e de acrescer (2137).

Note-se que o repúdio não pode ser feito sob condição ou a termo (2064/1) e, em regra, deve

ser total, salvo nos casos previsto no art. 2055/1 (2064/2).

Por outro lado, o repúdio está sujeito à forma exigida para a alienação da herança (2063), ou

seja, deverá constar de documento particular (2126/2), salvo existindo bens cuja alienação

exijam escritura pública, caso em que será esta a forma a adoptar (2126/1).

Nenhum destes detalhes é referido no texto. Mas vamos admitir, para efeitos do exercício, que

o repúdio foi feito de forma válida. E, sendo assim, visto ser irrevogável (2066), D está numa

situação de «não querer aceitar» a herança, o que daria lugar à sua substituição por

representação, caso tivesse descendentes, o que não é o caso. Mais uma vez se dá o direito de

acrescer a favor dos outros herdeiros legitimários (2137/2).

Visto termos concluído que D tinha sido declarado indigno, restam dois herdeiros

legitimários: F, por um lado, e C, representado por H e I face à deserdação daquele.

Assim, temos: 120.000 : 2 = 60.000

F = 60.000 (30.000 Legítima + 15.000 acrescer de D + 15.000 acrescer de E);

H = 30.000 (15.000 ½ legítima de C + 7.500 acrescer de D + 7.500 acrescer de E)

C

I = 30.000 (15.000 ½ legítima de C + 7.500 acrescer de D + 7.500 acrescer de E)

***

Anel de noivado:

trata-se de um legado com substituição directa a favor de J. Esta

substituição directa prevalece na sucessão testamentária (2041/2-a), pelo que afasta o direito

de representação.

A apenas referiu, como condição para a substituição, a situação de C “não querer” aceitar,

3

A Prof. Assistente aconselha a ir por este caminho quando da resolução dos testes, o que enriquece a solução.

Sucessões: I – Sucessões

[Caso ditado (2)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

21

mqa o que acabou por suceder foi uma situação de “não poder” face à deserdação de que foi

alvo. Poderá a substituição operar ainda assim?

A doutrina entende que sim: que a situação de “não poder” só seria afastada caso o testador

expressamente tivesse estipulado que “apenas se não quiser aceitar”, i.e., para que se possa

afastar as situações de não poder” o testador tem que o dizer expressamente (2281).

O que sucede à deixa, tendo em conta que C não pode aceitar e J morreu antes da abertura da

sucessão? A cláusula testamentária caduca de acordo com o art. 2317º/al. a).

Conta de 15.000,00 euros:

X reunia todos os pressupostos de que a lei faz depender a

vocação: existência (sobreviveu ao autor da sucessão), capacidade e título sucessório

prevalente. Logo, era chamado à sucessão na qualidade de fiduciário, qualidade esta que lhe

garante o gozo da coisa numa situação equiparada à de usufrutuário – em rigor, não possa ser

assim considerado, uma vez que é antes um proprietário temporário, embora com limitações

no que se refere ao direito de alienação. Por sua morte, o legado de crédito passaria a Z por

substituição fideicomissária.

Incidentalmente, diga-se que não se admite fideicomissos a título de legítima subjectiva, mas

tão só na quota disponível.

Segundo o art. 2293/2, se o fideicomissário não quiser ou não puder aceitar, os bens revertem

para o fideicomissário. Mas o que se passou no presente caso não foi uma situação de não

querer nem de não poder juridicamente relevante: foi apenas uma situação de não poder de

facto, devido ao estado de coma em que X mergulhou em Março de 2003, um mês antes da

abertura da sucessão. Quid iuris?

No que toca a V, herdeiro de X, ele vem a tomar a posição deste não através do direito de

representação ou de uma substituição, mas por meio da «transmissão do direito de suceder» a

que se refere o art. 2058. Tal implica uma dupla aceitação: primeiro, da herança de X, onde

reside o direito de suceder que se transmite com a respectiva herança, e, em segundo lugar, da

herança de A.

V é capaz, sobrevive ao autor da herança e tem título sucessório prevalente a seu favor. Logo,

é chamado à sucessão como legatário. Significa isto que ele ficará na posição de fiduciário até

à sua morte, em lugar do seu ascendente? Não, porque o legado foi transmitido ao

fideicomissário Z (2286), por efeito da morte de X (2293/3). V apenas sucede naquilo que

cabia por direito a X: o direito aos frutos civis da conta bancária no período que vai da

abertura da sucessão à morte de X (2290/1).

Assim os 15.000 da conta bancária vão entrar na quota disponível como legado a favor de Z.

A partir daqui ainda não foi resolvido nas aulas. A a imputação e a colação/igualação da

partilha será estudada mais tarde a propósito de outros casos.

***

9.º Caso ditado (2)

Ana e Bento, ambos viúvos, casaram sob o regime de separação de bens. Ana tinha uma

filha do seu anterior casamento, Carla, e Bento tinha também um filho do seu anterior

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 64)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

22

casamento, David.

Carla casa com Edgar, tendo celebrado convenção antenupcial onde estipulou o regime de

separação de bens. Deste casamento nasceram Francisco e Gonçalo.

Em 1994, Ana faz testamento cerrado com o seguinte teor:

“1 – Deixo a Bento metade da minha quota disponível;

2 – Deixo a Ivo a outra metade da minha quota disponível.”

Em 2000, Francisco mata Bento.

Em 2001, Ana faz testamento cerrado com o seguinte teor:

“1 – Deserdo Francisco por ter assassinado Bento se ele vier a ser condenado por tal

crime.”

Em 2001, foi justificada a ausência de Carla, entrando-se na fase de curadoria definitiva.

Em Janeiro de 2002, Ana morre e um mês depois Francisco é condenado a 10 anos de

prisão pela prática de homicídio doloso consumado na pessoa de Bento.

Diga, justificadament e, qual o destinos dos bens de Ana.

***

Tópicos de resolução provisória (a desenvolver):

1994

: DTH a favor de B = ½ QD

DTH a favor de I = ½ QD

2001

: deserdação de F (2166/1-a, sujeita a condição

2035/1-2, 2166/2, segundo JDP por analogia); apesar

de não ser um herdeiro prioritário, pode ser

deserdado pois é um descendente do testador.

2001

: ausência de Carla (99). Equiparação à morte para efeitos de vocação indirecta? PCR +

OA = Sim; JDP = Não. Concorda com Pereira Coelho que rejeita esta equiparação. Estes

últimos resolvem pelo art. 120: sucessível subsequente – vocação subsequente. Ver também

121/2: os chamados são considerados curadores definitivos – sucessão resolúvel. Para a

Prof. Assistente, o que faz sentido é chamar os sucessíveis por direito de representação, uma

vez que o 120 equipara o ausente ao falecido.

2000

: morte de B. A regra é que o pré-decesso do sucessível faz caducar a disposição

testamentária, mas o art. 2317/a ressalva a representação sucessória; aqui não se aplica a

limitação do art. 2042. Assim, a deixa passa a D, filho de B, por direito de representação

(2039 e ss).

Quanto a I não havia problema.

10.º Caso (Nº 64)

A

ndré, casado com Bruna, tinha 3 filhos: Cátia, Duarte e Eduardo. B

runa tinha ainda um

filho de um anterior casamento –

T

iago.

A

c

B

F

D

I

E

c

C

G

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 64)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

23

C

átia era casada com Frederico e tinha uma filha, chamada I

sabel.

D

uarte era casado com Guida e tinha um filho – J

oão.

E

duardo era solteiro.

A

ndré e B

runa morreram, na madrugada de 2 de Janeiro de 2001, num acidente de via ção,

tendo sido

C

átia transportada ao hospital ainda com vida, vindo a falecer poucas horas

mais tarde.

Em Dezembro de 2000, tinha sido declarada a morte presumida de

D

uarte.

Dois anos antes,

A

ndré tinha feito testamento cerrado, com as seguintes cláusulas:

“a) Deixo a

X

uxa a minha casa de férias na Madeira, que corresponde a 1/3 da minha

quota disponível.

b) No caso de

Xuxa não querer aceitar, o referido bem passará para Y

an.

c) Deixo ainda 1/3 da minha quota disponível a

M

arta e, por morte desta, os mesmos bens

passarão para

Paulo. Por morte de Paulo, os bens reverterão para Z

é.”

Sabendo que:

a)

Isabel fora deserdada por A

ndré em Novembro de 2000;

b)

Xuxa morreu antes de A

ndré;

c)

Yan faleceu antes de André e deixou uma filha, K

ika;

d)

Marta era casada com Nelson de quem tinha uma filha, Otília; P

aulo era casado

com

Sónia e tinha uma filha – R

ita;

e)

M

arta faleceu dia 3 de Janeiro de 2001, sem ter aceite nem repudiado a herança de

A

ndré;

f) No dia 4 de Maio de 2001, descobre-se que

E

duardo ocultou dolosamente o

testamento de

A

ndré;

g) No momento da abertura da sucessão, a casa de férias na Madeira vale 8.000

Euros;

h) André deixou bens no valor de 100.000 Euros e dívidas no valor de 10.000 Euros;

proceda à partilha da herança de André, justificando todas as operações efectuadas.

***

Não havendo doações em vida a analisar, passamos directamente para o estudo das deixas

testamentárias:

Alínea a):

X:

é contemplada com a deixa da casa da Madeira (8.000) que corresponde a 1/3 da herança

do de cujus: trata -se de um legado (2030/2), não sendo relevante a referência ao 1/3 da

herança. Ainda que o valor da casa seja inferior à terça parte da herança, X não tem direito a

X Y

K

O

M

----

N Z

R

P

------

S

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 64)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

24

mais nada.

Não preenche os requisitos da vocação sucessória (2032/1), visto ser pré-morta. Não tem

descendentes, mas, ainda que os tivesse, não haveria direito de representação, por ter sido

nomeado Y como substituto (2041/2-a). Na sucessão testamentária, a substituição directa

prevalece sobre o direito de representação.

Alínea b):

Y:

é nomeado legatário por substituição directa de X, mas também ele morre antes do autor

da sucessão. Há direito de representação em favor dos seus descendentes (K), nos termos

dos artigos 2039, 2040 e 2041.

K: por direito de representação de Y

: reúne os requisitos para ser chamada à sucessão: é

chamada à sucessão em representação de Y. Tem capacidade, título sucessório prevalente e

sobreviveu ao de cujus (2032/1).

Alínea c):

M:

é instituída herdeira em 1/3 da QD (2030/2), com substituição fideicomissária a favor de

P (2286). Isto significa que M, na qualidade de fiduciária, será proprietária dos bens

correspondentes à terça parte da quota disponível da herança, sendo gravada com o encargo

de manter esses bens para que estes passem, por sua morte, para o fideicomissário (P).

M morreu um dia após o autor da sucessão, antes de ter aceitado ou repudiado a herança.

Verifica-se transmissão do direito de suceder a favor de O e N, herdeiros de M (2058/1):

mas os herdeiros apenas sucedem nos direitos que pertenceriam ao usufrutuário entre a data

de abertura da sucessão e a data da morte do fiduciário; os bens passam ao fideicomissário

P, nos termos do Art. 2293/3.

P:

é o fideicomissário nomeado, recebendo os bens por morte do fiduciário. Por sua morte,

os bens em causa passam aos seus herdeiros e não a Z, pois a cláusula fideicomissária em

mais de um grau é nula (2188), tendo-se por não escrita (2189).

Herdeiros legitimários:

São herdeiros legitimários, neste caso, o cônjuge B e

os descendentes C, D e E (2157, 2133/1-a, 2134 e

2135).

Nem todos estes reúnem, porém, os três requisitos da

vocação exigidos pelo Art. 2032/1: título sucessório

prevalente, capacidade e sobrevivência ao de cujus.

Vejamos um a um.

B: pré-morto.

Morre em 02JAN2001 juntamente com o autor da sucessão. Há presunção de

comoriência (68/2) que é equiparada, para este efeito, à pré-morte. Falta-lhe o requisito da

sobrevivência e, por isso, não vai ser chamado à sucessão.

E

I

T

J

F

----
C D ----

G

A

----

B

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 64)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

25

Não há direito de representação, uma vez que este só se verifica em favor de descendentes

de filho do autor da sucessão e B era cônjuge.

C: era sobrevivo, tinha capacidade e título prevalente

(2157, 2133/1-a, 2134-2135), mas

morre horas depois do autor de cujus antes de aceitar ou repudiar a herança. O direito de

suceder à herança de A transmite-se aos seus herdeiros F e I (2058/1), caso estes aceitem a

sua herança (2058/2). Os herdeiros são livres de aceitar ou repudiar a herança de A.

F: por transmissão do direito de suceder (2058/1)

: ocupa sozinho a posição de C

na sucessão legal: recebe a sua metade por direito próprio (2136) e a outra metade

por direito de acrescer de I (2301/1).

I: não vai suceder a A,

visto ter sido por ele deserdada em 2000. Não é possível

aferir da validade da cláusula de deserdação, por o texto não nos dar elementos

suficientes, mas vamos considerar que havia causa jurídica para a deserdação e que

tal causa foi expressamente indicada na cláusula de deserdação (2166/1).

A deserdação produz os mesmos efeitos que a indignidade (2166/2), pelo que I deixa

de ter capacidade para suceder a A (2037/1). Embora haja quem defenda que ao

transmissário do direito de suceder basta que seja capaz relativamente ao segundo de

cujus, para os Professores PCR e JDP o requisito da capacidade tem que verificar-se

em relação aos dois.

A incapacidade por indignidade não prejudica o direito de representação na sucessão

legal (2037/2), mas I não tinha descendentes e, por isso, dá-se acrescer em benefício

de F (2137/1), que é da mesma estirpe.

D: equiparado a pré-morto:

a morte presumida (declarada em 2000, antes da abertura da

sucessão) é equiparada à morte (115), pelo que não reúne os requisitos da vocação

sucessória (2032/1). Dá-se direito de representação a favor de seu filho J (2039, 2042).

J: por direito de representação:

vai ocupar sozinho a posição de D. O direito de

representação apenas se verifica a favor de descendentes de filho ou irmão do autor

da sucessão, ao contrário da transmissão do direito de suceder que beneficia todos os

herdeiros do segundo de cujus.

E: indigno:

o acto de esconder dolosamente o testamento do de cujus

é causa de

indignidade, nos termos do Art. 2034/d. Levanta-se a discussão quanto a saber se é sempre

necessária uma acção judicial de declaração da indignidade ou se esta é de funcionamento

automático, uma vez verificada causa jurídica.

Oliveira Ascensão: a indignidade é de funcionamento automático, não sendo necessária

acção judicial de declaração, a não ser quando o indigno já se encontra na posse dos bens da

herança;

PCR e JDP: contestam a posição de Oliveira Ascensão, exigindo declaração judicial da

indignidade.

Vamos supor que E foi declarado indigno. A declaração de indignidade tem como efeito a

incapacidade do indigno para suceder à herança (2037/1), pelo que falta assim um requisito

da vocação sucessória (2032/1).

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 60)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

26

O Art. 2037/2 salvaguarda o direito de representação dos descendentes do indigno, mas E

não deixou qualquer descendente. Assim, vai funcionar o direito de acrescer (2137/1) a

favor dos outros herdeiros legitimários .

Em suma:

1) B não é chamado à sucessão e não há direito de representação ou direito de acrescer;

2) A posição de C é ocupada por F, transmissário do direito de suceder; este beneficia

de direito de acrescer de I, herdeiro de C, afastado da herança de A por deserdação;

3) D, cuja morte presumida foi declarada antes da abertura da sucessão, é considerado

pré-morto. A sua posição vai ser ocupada por J por direito de representação;

4) E foi declarado indigno, não tendo descendentes. A sua parte vai para os outros

herdeiros legitimários por direito de acrescer.

PARTILHA:

Cálculo do valor total da herança (VTH):

VTH = 100.000(R)+0(D)-10.000(P); VTH = 90.000

Cálculo da quota indisponível (QI)

2159/2: QI = 2/3 (60.000); QD = 30.000

Cálculo da legítima subjectiva:

2139/2 60.000 / 30 = 20.000

Depois de cumpridas as deixas testamentárias (8.000 + 10.000) sobram livres 12.000 dos

30.000 que havia na QD, que vão ser divididos em partes iguais pelos dois herdeiros

legitimários representados pelos respectivos herdeiro e descendente. Cada um deles recebe,

assim, 6.000 a título de sucessão legítima.

Mapa da partilha:

1) 10.000 por transmissão do direito de

suceder de C, 10.000 por acrescer de I e

10.000 por acrescer de E

2) 20.000 por direito de representação e

10.000 por acrescer de E

3) É afastado da sucessão por indignidade

4) Sucessão legítima (2131)

5) Legado da casa da Madeira, por

representação de Y

6) Por substituição fideicomissária (2293/1)

11.º Caso (Nº 60)

Em 1975,

A
dão, marinheiro, casa com Bia, nascendo desse casamento Carla, Dora, E

va e

F

ilipe.

Em Maio de 1995,

Adão doa a C

arla o seu andar em Sintra.

QI = 60.000 OBS QD = 30.000 OBS Total

(C)F = 30.000 1) 6.000 4) 36.000

(D)J = 30.000 2) 6.000 4) 36.000

E = 0 3) 0

K = 8.000 5) 8.000

P = 10.000 6) 10.000

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 60)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

27

Em 1997, Adão faz testamento cerrado, estipulando o seguinte:

“Deixo o meu velho Ferrari ao meu primo Luís e, com a sua morte, deverá reverter para

Nuno; instituo Olga como minha herdeira, de acordo com o que escrevi no meu diário de

bordo de 1996.”

No ano seguinte, Adão doa a Guida, filha de Carla, o seu carro BMW e a Eva o seu iate.

Em 5 de Maio de 1999, Dora é condenada em 15 anos de prisão por homicídio doloso de

Bia.

No dia seguinte, Adão é, por sentença judicial, declarado interdito por anomalia psíquica.

Em 10 de Junho de 2001, Adão e Carla, ao saírem da igreja onde se realizara o casamento

de Filipe com Júlia, são atropelados por um camião, falecendo de imediato no local.

Dias depois, Júlia fica viúva.

Faça a partilha da herança de Adão, sabendo que:

Luís, declarado indigno por sentença judicial, tem uma filha, Zira; Dora tem o filho

I

gor;

Carla, casada com Manuel, tem, além da filha Guida, o filho Hugo, tendo este sido

deserdado pela sua mãe, por ter destruído o testamento que esta havia feito;

Eva repudia;

No diário de bordo de Adão consta o seguinte: “Deixo a Olga 1/5 da minha

herança”;

Adão deixa um património de 80.000 Euros e dívidas no valor de 10.000 Euros, o

BMW 11.000 Euros e o iate 19.000 Euros.

***

I – Doações em vida:

A favor de C:

1995 – Casa de Sintra: 50.000.

C é herdeiro legitimário e

pretende concorrer à sucessão

do doador, pelo que a doação é

imputável na QI e está sujeita a

colação (2157, 2133/1-a, 2134 e

2135, 2104, 2105 e 2110).

A favor de G:

1998 – BMW: 11.000. G é filha de C e não é presuntiva herdeira legitimária à data da

doação, pelo que não está sujeita a colação (2105 a contrario).

A favor de E:

1998 – Iate: 19.000. Tendo em conta que E é descendente do de cujus e pretende

concorrer à sucessão, sendo já presuntiva herdeira à data da doação, está sujeita à

D

G I

M

----
C F ----

J

A

----

B

H

E L

Z

N

O

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 60)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

28

colação (2104 e 2105; 2157, 2133/1-a, 2134 e 2135).

II – Sucessão legitimária:

São herdeiros legitimários de C o cônjuge e as descendentes: B; C, D, E e F. Sucede que

nem todos reúnem os pressupostos da vocação constantes do Art. 2032/1. Vejamos um

por um:

B: pré-morto –

cônjuge do autor da sucessão, foi assassinada por D antes da abertura da

sucessão. Não reúne o pressuposto da sobrevivência ao de cujus, pelo que não será

chamada à sucessão. Não há direito de representação (2042) nem direito de acrescer.

C: pré-morto

– morre ao mesmo tempo que o autor da sucessão: comoriência (68/2), que

é equiparada à pré-morte. Deixa descendentes: G e H, que vão assumir a sua posição por

direito de representação (2039, 2042).

G: sucede por direito representação

– é descendente directo de filho do autor da

sucessão, que não pode aceitar a herança por ter falecido antes da abertura da

sucessão. O mesmo tem capacidade quer em relação à mãe quer em relação ao avô,

autor da sucessão, embora apenas esta última seja exigida (2043);

H: sucede por direito de representação

– é descendente directo de filho do autor da

sucessão, que não pode aceitar a herança por ter falecido antes da abertura da

sucessão. Foi deserdado por sua mãe por ter destruído o testamento desta, mas a razão

invocada não é causa de deserdação, pelo que a cláusula é nula (2166/1). Mesmo

sendo nula a cláusula de deserdação, os factos praticados por H são causa de

indignidade (2034/d), sendo que os efeitos da declaração de indignidade são os

mesmos que seriam aplicados à deserdação: a perda de capacidade para suceder.

Vamos considerar que a declaração de indignidade tenha sido feita (neste ponto fazer

sempre referência à posição de OA em contraponto à de PCR e LDP): ainda assim, H

vem ocupar a posição de C na sucessão legal pois o que deve ser aferido é se ele tem

capacidade em relação ao autor da sucessão (A), sendo a incapacidade em relação a C

irrelevante (2043);

D: afastada por indignidade

– tendo sido condenada a 15 anos de prisão por homicídio

do cônjuge do autor da sucessão, poderia ser deserdada nos termos do Art. 2166/1-a,

sendo os efeitos da deserdação equiparados aos do indigno (2166/2). Todavia, devido à

interdição por anomalia psíquica de A no dia seguinte à leitura da sentença, parece que

não terá havido tempo para este fazer testamento.

Levanta-se aqui a questão de saber se a declaração de indignidade opera ipso iure, como

defende Oliveira Ascensão (com a excepção dos casos em que o indigno já esteja na

posse de bens da herança) ou se é sempre necessária acção judicial de declaração de

indignidade, como propugnam PCR e JDP.

De uma forma ou de outra, no presente caso vamos considerar que D foi declarada

indigna de suceder a A.

Face à situação de “não poder” aceitar por parte de D, e visto que a indignidade não

prejudica o direito de representação na sucessão legal (2037/2), I vem ocupar a posição

de D;

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 60)

]

Carlos Fernandes – 2007/2008

29

I: por direito de representação

– sendo descendente directa de D, filha de A,

beneficia do direito de representação nos termos dos artigos 2039 e 2042 e 2037/2.

E:

repudia a herança (2062). Presumimos que terá respeitado a forma exigida no Art.

2063. Como não tem descendentes que possam ocupar a sua posição por direito de

representação, a sua parte acresce à dos outros herdeiros da mesma estirpe (2031).

F:

sobrevive ao de cujus

, tem capacidade e era detentor de um título sucessório prevalente

(2157, 2133/1-a, 2134 e 2135). Cumpria, por isso, todos os pressupostos da vocação

(2032/1). Faleceu, no entanto, dias depois da abertura da sucessão, sem que seja dito que

aceitou ou repudiou a herança. Vamos pressupor que o não fez.

Neste caso dá-se a transmissão do direito de suceder para o único herdeiro conhecido: o

cônjuge J (2058/1).

J: transmissária do direito de suceder (2058)

: sucede nos direitos que F tinha em

relação à herança.

Em síntese:

1) B não é chamado à sucessão por ser pré-morto;

2) C morreu em simultâneo com o autor da sucessão: comoriência, equiparada à prémorte;

a sua posição vai ser ocupada descendentes pelos seus descendentes G e H;

3) D é indigna, mas a sua posição é ocupada por I, por direito de representação;

4) E repudia a herança: a sua parte acresce à dos outros herdeiros da mesma estirpe;

5) F morre depois do autor da sucessão, sem ter aceitado ou repudiado a herança.

Sucede-lhe J, transmissária do direito de suceder nos termos do Art. 2058/1.

III – Cálculo da herança e da legítima subjectiva

VTH=80.000(R)+80.000(D)-10.000(P); VTH = 150.000

QI = 150.000(VTH) x 2/3 = 100.000; QD = 50.000 (2159/2)

Mapa da partilha abstraindo do repúdio de E e da imputação das doações e deixas

testamentárias:

QI = 100.000 OBS QD = 50.000 OBS Total

(C)G = 12.500

(C)H = 12.500

(D)I = 25.000

E = 25.000

(F)J = 25.000

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 60)

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Carlos Fernandes – 2007/2008

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IV – Sucessão testamentária

1ª Cláusula testamentária:

L: (Ferrari de 10.000) fiduciário indigno –

trata-se de um legado (2030/2) com cláusula

de substituição fideicomissária a favor de N (2286/1). O fiduciário (L) é mais do que um

usufrutuário , é uma espécie de proprietário temporário (2289-2291), assumindo o encargo

de conservar os bens deixados para que, por sua morte, possam passar ao fideicomissário.

Tendo sido declarado indigno, L não tem capacidade para adquirir o legado (2037/1). Na

sucessão legal a indignidade não prejudica o direito de representação (2037/2), mas o

mesmo já não sucede na sucessão testamentária (mesmo artigo a contrario). Ainda que

houvesse direito de representação, neste caso o legado iria para o fideicomissário, uma vez

que a substituição feita pelo testador prevalece em relação aquele (2041/2-a). Assim, a

substituição fideicomissária converte-se em directa e o legado passa a N, nos termos do Art.

2293/3.

N: fideicomissário

– beneficia da situação de L “não poder” aceitar o legado, que converte

a substituição fideicomissária em directa (2293/3). Não tem, assim, que esperar pela morte

de L para entrar na propriedade dos bens legados.

2ª Cláusula testamentária:

E: deixa testamentária a título de herança ferida de nulidade

– deixa de 1/5 da herança,

que constitui um exemplo do testamento per relationem, previsto no art. 2184, cuja validade

depende de requisitos de forma e de conteúdo:

Forma

: exige-se que o testamento remeta para documento autêntico ou documento

particular escritos e assinados pelo testador com data anterior à data do testamento ou

contemporânea desta. Remetendo para um diário de bordo, o requisito de forma está

preenchido, pois se trata de documento particular “escrito e assinado pelo testador”,

sendo a data deste de 1996, anterior à do testamento que é de 1997;

Conteúdo

: os elementos essenciais não pdoem constar unicamente do documento para o

qual o testamento remete, antes de que estar incluído no próprio testamento. São

elementos essenciais, nos termos do Art. 2182/1, os seguintes:

1. a instituição de herdeiros ou nomeação de legatários;

2. o objecto da herança ou do legado;

3. o cumprimento ou não cumprimento das disposições testamentárias.

Vemos que a nomeação da legatária é feita no testamento, mas o objecto do legado é

remetido para o diário de bordo, pelo que o testamento não cumpre os requisitos

mínimos de validade. A deixa é, assim, nula.

V – Mapa da partilha

Estamos agora em condições de preencher o mapa da partilha definitiva. Para tanto, teremos

que proceder à imputação do legado do Ferrari e das doações feitas em vida. Há que

proceder à igualação da partilha na parte que diz respeito às doações em vida sujeitas a

colação, ou seja, aquelas que foram feitas a descendentes que concorrem à sucessão e que

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 60)

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eram já, à data da doação, presuntivos herdeiros legitimários do doador.

Assim, temos:

a) Doação em vida feita a E (iate de 19.000):

i) É uma doação feita em vida a descendente que era, à data da doação, presuntivo

herdeiro do legitimário do doador (2104 e 2105);

ii) O descendente concorreu à sucessão por intermédio dos seus representantes (2104);

iii) Esta doação está abrangida pelo disposto no Art. 2110;

iv) Não está dispensada de colação (2113);

v) Logo, está sujeita a colação e será imputada na QI.

Apesar de E ter repudiado a herança, vamos imputar a doação numa legítima subjectiva

fictícia, no valor de 25.000, que era a parte que caberia a E caso não tivesse repudiado.

Restam apenas 6.000 da legítima fictícia de E e são estes apenas que vão ser distribuídos

pelos herdeiros da mesma estirpe por acrescer (6.000/3=2.000). J e I vão receber cada um

2.000, enquanto G e H recebem 1.000 cada um

O resultado da partilha legitimária até este ponto fica então assim:

G = 13.500 (12.500 por representação de C + 1.000 por acrescer de E)

H = 13.500 (12.500 por representação de C + 1.000 por acrescer de E)

I = 27.000 (25.000 por representação de D + 2.000 por acrescer de E)

J = 27.000 (25.000 por transmissão do direito de suceder de F + 2.000 por acrescer de E)

b) Doação da casa de Sintra a C, no valor de 50.000:

Vale aqui tudo quanto foi dito nos pontos i) a v) da alínea anterior.

A legítima subjectiva de C, já incluindo o valor que recebeu por acrescer devido ao repúdio

de E, é de 27.000.

Temos, assim, que a doação será imputada na QI até este valor e na QD os restantes 23.000,

ficando estes sujeitos a igualação.

c) Doação do BMW a G

Como G não era presuntivo herdeiro legitimário do doador ao tempo da doação, não está

sujeito a colação (2105 a contrario). Logo, esta doação é imputada na QD e não está sujeita

a igualação.

d) Imputação das deixas testamentárias :

Nada dizendo o testador quanto ao tipo de legado, deve entender-se que quis avantajar o

contemplado: trata-se de pré-legado (2264). A regra geral é, assim, de serem imputadas na

QD, ao contrário do que sucede com as doações em vida. O legado do Ferrari é imputado na

QD, em favor de N.

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 60)

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Calculadas as legítimas subjectivas, corrigidas por efeito do acrescer e feitas as imputações

das doações e do legado, importa gora proceder à igualação por efeito da colação, nos

termos do artigo 2108.

Em primeiro lugar, vamos calcular a quota hereditária:

QD livre = 50.000-11.500-11.000-11.500-10.000; = 6.000

Quota da legítima fictícia = 23.000 (valor sujeito a colação)+6.000 (QD livre)/3; = 9.666.

Quota hereditária = 27.000 (L. Subjectiva)+9.666=36.666

Assim, para I e J o valor da quota hereditária é de 36.666; para G e H é ½ desse valor

(18.333).

G e H já receberam cada um 25.000, tendo ultrapassado a sua quota hereditária; assim, o

valor livre da QD será dividido em partes iguais por I e J (2136):

6.000/2=3.000.

Outra forma de fazer a igualação é aquilo a que o Professor JDP chama de método do

“olhómetro”.

Aqui prescinde-se do cálculo da quota hereditária e começamos logo por igualar o que

estiver mais desfavorecido, subindo sequencialmente para os restantes.

No caso em estudo teríamos:

I e J estão igualados abaixo do C (representado por G e H). Assim, atribui-se a cada um

daqueles um valor idêntico para os igualar, ou pelo menos aproximar, do valor atribuído à

parte de C.

Como só tínhamos 6.000, dividimos por 2, o que dá 3.000 para cada um; não havendo nada

mais para atribuir, apenas se consegue a igualação possível. O Prof. JDP diz que este

método é mais fácil, mas mais sujeito a erros.

Apesar de a igualação ser apenas parcial, a colação não leva à redução das liberalidades .

Isso só ocorre quando elas sejam inoficiosas, o que não é o caso.

Eis o mapa final da partilha:

1) Imputação de ½ de 27.000

referente à doação em vida a C na

legítima subjectiva alargada com o

direito de acrescer de E;

2) Imputação de ½ dos 23.000

relativos à doação que não couberam

na legítima subjectiva e que vão ficar

sujeitos a colação;

3) Imputação da doação de 19.000

numa legítima fictícia de E; os

restantes 6.000 foram acrescidos às

quotas dos outros herdeiros

legitimários

4) Imputação da doação do BMW,

não sujeito a colação;

5) Imputação do legado do Ferrari,

não sujeito a colação;

QI = 100.000 OBS QD = 50.000 OBS Total

(C)G = 13.500 1) 11.500 2) 25.000

11.000 4) 11.000

(C)H = 13.500 1) 11.500 2) 25.000

(D)I = 27.000 3.000 30.000

E = 19.000 3) 19.000

(F)J = 27.000 3.000 30.000

N = 10.000 5) 10.000

Totais: 100.000 50.000 150.000

Livres: 0

Sucessões: I – Sucessões

[Caso (Nº 60)

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Carlos Fernandes – 2007/2008

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Subhipóteses:

a) Temos os mesmos 6.000 livres da QD, mas J tem uma doação de 2.000 sujeita a colação.

Resolução segundo o método a que o Prof. JDP chama “olhómetro”:

Primeiro iguala-se dando a I o mesmo que J já tem devido à doação: J 2.000; I +2.000;

Depois dividem-se os restantes 4.000 (6.000-2.000=4.000) pelos dois em partes iguais (2136),

dando 2.000 para cada um. Isso levaria à igualação total entre os dois.

A mesma situação, mas J está dispensado de colação (2113).

Não há lugar a igualação, pelo que o valor livre é dividido em partes iguais:

J=(2.000+3.000)5.000; I = 3.000.

Imaginemos que temos agora três herdeiros B, C e D. O primeiro tem uma doação de 2.000 e

o segundo uma de 4.000, ambas sujeitas a igualação por colação. O terceiro não tem nada. Há

9.000 livres da QD.

1) Pelo método do olhómetro, aribuímos em primeiro lugar 2.000 a D, igualando-o com B.

Restam 7.000.

2) Em segundo lugar, atribuímos 2.000 a B e outros 2.000 a D, igualando-os com C. Neste

momento todos têm 4.000 e restam livres 3.000 da QD;

3) Dividem-se os restantes 3.000 pelos três herdeiros em partes iguais: 1.000 a cada um.

Todos ficam exactamente com o mesmo: 5.000. Há uma igualação total.

QI QD Total

B = 2.000+2.000(

2)+1.000(3

) 5.000

C = 4.000+1.000(

3

) 5.000

D = +2.000(

1)+2.000(2)+1.000(3

) 5.000